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O ESTADO DA ARTE


Manuel Pinho


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ARTE DO ESTADO?

AUGUSTO M. SEABRA

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A intervenção do Estado na área da cultura é (ainda) objecto de reticências e refutações. Todavia, na complexidade das sociedades contemporâneas, e no relevo nelas acrescido dessa área cultural, essa intervenção é justificada pela defesa da diversidade, pela necessidade de mecanismos de redistribuição territorial e social, pelo apoio à criatividade nas suas mais variadas manifestações e processos e pela promoção da imagem externa de um país.

A associação de um ministério da Cultura – ou mais genericamente da intervenção do Estado nesse campo - a uma entidade de propaganda é assim uma comparação que não colhe, porque o seu campo de regulação e intervenção se funda nos princípios fundamentais do Estado democrático, na tripla vertente da universalidade (o conjunto das políticas destina-se ao conjunto dos cidadãos), do respeito pela soberania individual e de representação externa. Aliás, não deixa de ser irónico, mas também sintomático, que o principal veiculador dessa tese no espaço público em Portugal, Pacheco Pereira, seja ele mesmo um caso ímpar (e mesmo insólito) de interventor obsessivo no sentido de condicionamento da agenda política e mediática – ou, dito de outro modo, um caso ímpar de especialista em propaganda própria.

Todavia, é não menos necessário o escrutínio público pelas mediações e poderes particulares que se estabelecem nas áreas artísticas e culturais, nas instâncias de decisão e de legitimação, e até tanto mais quanto o próprio relevo acrescido dessas áreas, do seu “capital simbólico”, justamente fazem algumas dessas instâncias de mediação estar numa crescente proximidade, se não mesmo dependência directa, do poder político. O caso ainda recente da tentativa pobremente “faustiana”, mas grave, de uma dita “fusão a frio” entre dois institutos públicos então existentes num único Instituto das Artes, e o inequívoco curso de “dirigismo cultural” encetado por quem foi protagonista desse processo, Paulo Cunha e Silva, é exemplo bastante dos riscos possíveis.

Num conjunto de artigos sobre “Arte e sistema”, em 2003/05, entendi trazer claramente ao debate público a consideração de como um conjunto restrito de mediadores privilegiados se constituíam numa esfera autónoma e num exorbitante poder próprio, uma “nomenkultura”. Forçoso é constatar agora que essa situação se agravou com muito mais directas imbricações em instâncias do poder político executivo. Recordo, a propósito, que na origem dessa análise estavam alguns dos prémios de maior relevo, e em concreto a circulação de jurados, bem como as promiscuidades de alguns mediadores privilegiados entre instituições públicas e privadas.

Um desses prémios, entretanto surgido, e também o que mais polémicas tem suscitado, é o BESPhoto. Entretanto, um alto quadro dirigente desse banco e conhecido coleccionador de fotografia, Manuel Pinho, foi nomeado Ministro da Economia, sendo os interesses do BES na área da fotografia da responsabilidade imediata de Alexandra Fonseca Pinho – um casal de amadores da arte fotográfica, pois. Em Março de 2004 promovia Pinho na sede do seu ministério uma exposição destinada a celebrar “o primeiro aniversário da tomada de posse do XVII Governo Constitucional”, contendo a brochura contributos dos mais eminentes “papas culturais”, Eduardo Prado Coelho e Vasco Graça Moura (este um dos mais acérrimos críticos de uma suposta “subsidiodependência” que, no entanto, para o melhor e para o pior, está de há décadas ligado a intervenções públicas na área da cultura). Era uma exposição em que se assinalava a presença de Candida Höfer, no primeiro sinal público do que viria a ser o seu trabalho “Em Portugal”, mais tarde exibido no CCB, com apoio do BES, sendo que Alexandra Fonseca Pinho chamava a si, na apresentação do catálogo – por certo justamente – a iniciativa do convite.

Se a esfera de acção de Pinho&Pinho, o casal, já configura uma situação dificilmente admissível de promiscuidade entre um poder público que sucede ser o Ministério da Economia e um banco privado, de resto mais que uma vez legitimada pelo CCB, sucessivamente pelo então director do Centro de Exposições, Delfim Sardo, e a administradora Margarida Veiga, o ministro Pinho não tem cessado de reiterar o seu interesse directo por matérias fotográficas e expositivas. Sucede isso com a pitoresca iniciativa ALLGARVE – em que, para o lastro ser maior, a Fundação de Serralves se prestou a ser o braço executivo para as exposições -, no alto patrocínio e muito mais que isso à exposição Vic Muniz, cujo luxuosíssimo catálogo é um prodigioso exemplo de inanidades com destaque – pela sua particular adequação à retórica que as iniciativas de Manuel Pinho vão gerando – para o texto de Clara Ferreira Alves, ou para o directo apoio à participação dos artistas portugueses, sendo Portugal o país convidado na próxima PhotoEspaña.

Mas mais: foi Manuel Pinho, ele próprio, e ele só, sem um ministro da Cultura que está desaparecido, a assinar com Paulo Mendes da Rocha, arquitecto laureado com a máxima distinção do Pritzker, o contrato de trabalho para o novo Museu dos Coches – acto sintomático de como, com um vácuo efectivo no ministério da Cultura de já quase quatro meses, se expande a área de intervenção do ministro da Economia afinal também ministro da Cultura bis, sendo que na sua acção Pinho demonstra o que de mais pernicioso e grave pode existir numa política cultural pública – uma “política de gosto”, de “gosto do príncipe”.

Não é contudo o único: a complacência ao mais alto nível, a objectiva legitimação do sistema instituído de promiscuidades, concretiza-se no facto do assessor para a cultura do primeiro-ministro ser o crítico e programador que por si só representa exponencialmente esse sistema, Alexandre Melo - e diga-se aliás que há tanto mais legitimação directa quanto o primeiro-ministro José Sócrates já incluiu num programa de uma visita oficial, a Angola, a inauguração em Luanda da exposição itinerante “Portugal Novo”, de que o comissário é o seu próprio assessor.

É certo que, como aliás sempre reiterei, este “sistema” não é homogéneo e, na medida em que se exerce também por mecanismos de patrocínio e favoritismo, no seu seio há também concorrência. Foi assim que, sendo Melo o assessor do primeiro-ministro, a anterior ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, fez valer como seu crítico electivo Bernardo Pinto de Almeida, nomeado administrador da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea – Colecção Berardo, indigitado comissário para a arte contemporânea do anunciado pólo do Hermitage ou comissário da exposição “Linha do Horizonte - o motivo da paisagem na arte portuguesa contemporânea”, que agora abriu no Rio de Janeiro, nas comemorações dos 200 anos da chegada da Corte ao Brasil.

Mas nem é caso de frisar que a demissão de Pires de Lima mais deixa notório o protagonismo descomplexado e sem princípios que Alexandre Melo há muito exerce, pelo menos desde o ano de 1986 em que fazia a capa desse manifesto social de distinção que foi “A Idade da Prata”, álbum publicado pela editora do Estado, a Imprensa Nacional, ao tempo de Vasco Graça Moura. Pela sua posição e implicações das suas ligações, Alexandre Melo é mesmo um vértice que justifica consideração própria. Mas, entretanto, e de todo o exposto, há ainda assim que pôr a questão: não configurará então esta situação uma “arte do Estado”?

Uma revista francesa fazia capa recentemente com uma irónica declaração: “C´est officiel, il n´y a pas d´art officiel”. Diria então que o inegável, nesta sombria situação, é que no campo das artes visuais há, por “factos do príncipe” e patrocínios e promiscuidades sustentadas ao mais alto nível, um notório enviesamento do que devem legitimamente ser as modalidades de intervenção do Estado, nomeadamente do poder político executivo, que não configura tanto uma “arte do Estado” mas a “oficialização” de um sistema. De um sistema gravosamente inquinado…


Augusto M. Seabra