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ANUNCIADA PROGRAMAÇÃO FESTIVAL QUEER PORTO 5

2019-10-08




A 5.ª edição do Queer Porto – Festival Internacional de Cinema Queer tem lugar de 16 a 20 de outubro no Teatro Rivoli, Maus Hábitos e Reitoria da Universidade do Porto.

Os 50 anos passados sobre os motins de Stonewall conduzem inevitavelmente a uma reflexão sobre o que significou meio século dos modernos movimentos de luta LGBTI+, quais as suas conquistas políticas e sociais nos vários cantos do globo - onde tiveram naturalmente diferentes tempos e expressões -, ou o que significou o ativismo para a cultura queer. Se um olhar a estes movimentos e a estas conquistas nos ajudam nessa reflexão, também a cultura queer e em particular o seu cinema nos ajudam a traçar esta história, quer do ponto de vista das suas condições de produção, quer pela escolha dos sujeitos que representa e quem teve o privilégio de ambos: representar e ver-se representado. O Queer Porto procura, nesta sua 5.ª edição, lançar o desafio aos espectadores para, através da seleção de filmes, debates e restantes eventos paralelos, pensarem estas e outras questões levantadas pelo seu programa.
 
Precisamente, através de um ciclo de cinema dedicado a Stonewall, intitulado 50 Anos dos Motins de Stonewall, procuramos tocar nos temas da representatividade, das conquistas, das exclusões, das vozes que se viram silenciadas, mas também da disrupção que significou a epidemia da sida que, se por um lado significou o desaparecimento de uma expressiva parte da comunidade queer, por outro serviu de segundo impulso ao ativismo queer pós-Stonewall. Numa parceria com a Reitoria da Universidade do Porto, promovemos um debate alargado à volta da realidade do ativismo e cultura queer em Portugal, com um especial foco nas suas expressões na cidade do Porto, que terá como mote a exibição do já clássico documentário Before Stonewall (1984), de Greta Schiller e Robert Rosenberg. A este filme, juntamos outros que nos desafiam a estas leituras, como é o caso de Gay USA (1977), de Arthur J. Bressan Jr., em versão restaurada, prova também da preocupação em preservar o legado audiovisual LGBTI+, ferramenta fundamental para gerações futuras. E precisamente sobre a questão do arquivo, juntámos ao programa o muito recente The Archivettes (2018), de Megan Rossman, que foca a importância dos legados materiais para memória futura, neste caso sobre a realidade dos movimentos de lésbicas nos EUA. Porque esta história ficaria incompleta sem abordar o tema do VIH/sida, recuamos até 1985, ano em que foi estreada aquela que é considerada a primeira ficção cinematográfica sobre o tema, Buddies, de Arthur J. Bressan Jr. E culminamos com uma homenagem a uma figura maior das artes e do ativismo da sida, com o magnífico documentário Self-Portrait in 23 Rounds: a Chapter in David Wojnarowicz's Life, 1989-1991 (2018), de Marion Scemama e François Pain. Todos os filmes deste ciclo terão lugar no Teatro Rivoli, à exceção de Before Stonewall, que será exibido na Reitoria da Universidade do Porto.
 
Tendo como ponto de partida o documentário de Schiller e Rosenberg, após a sua exibição tem lugar um Debate que reunirá perspetivas provenientes do ativismo, da política, da prática médica, das práticas artísticas, ou do testemunho. Relembrando o exemplo de Stonewall, percorreremos os principais marcos de um caminho reivindicativo português, num momento perfeitamente oportuno à construção da memória e do futuro. Esta é uma iniciativa coorganizada pela Unidade de Cultura da Universidade do Porto, e com o apoio da Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade.
 
É ainda neste contexto, e integrado no mesmo ciclo sobre Stonewall, que o Queer Porto tem, este ano, como Filme de Abertura, o documentário The Cockettes (2002), de Bill Weber e David Weissman, um filme que nos transporta da psicadélica São Francisco dos anos 60 à São Francisco gay dos anos 70, e em que os The Cockettes, uma flamejante troupe de hippies (mulheres, homens gay e até bebés) se enfeitavam num drag gender-bender, com muito glitter, para uma série de lendários espetáculos à meia-noite no Palace Theatre de North Beach. Como Filme de Encerramento, o festival apresenta o argentino El Ángel, de Luis Ortega, estreado na edição de 2018 do Festival de Cinema de Cannes, e que tem colecionado prémios nos muitos festivais por onde tem passado. “El Ángel” é Carlitos, um jovem de 17 anos de idade, com a arrogância de uma estrela de cinema, cabelo loiro encaracolado e cara de miúdo, mas com um lado obscuro de roubos e embustes. Quando conhece Ramon na sua nova escola, Carlitos sente-se imediatamente atraído por ele e começa a chamar a sua atenção. Juntos embarcam numa viagem de descobertas, amor e crime.   
 
O Júri da Competição Oficial é este ano constituído por Adriano Baía Nazareth, realizador da RTP, pela cantora e compositora Ana Deus, pelo artista plástico Nuno Ramalho, e pela artista e curadora Susana Chiocca. Um total de oito longas-metragens de ficção ou documentais integram a competição. A Dog Barking at the Moon, de Xiang Zi, vencedor do Prémio do Júri dos Teddy Awards no mais recente Festival de Cinema de Berlim, conta-nos a história de Huang Xiaoyu, uma escritora chinesa radicada nos EUA que, ao voltar à China para passar uma temporada durante a sua gravidez, se vê presa nas dinâmicas disfuncionais dos seus pais e confrontada com o seu difícil passado familiar; em The Gospel of Eureka, Michael Palmieri e Donal Mosher - presentes no festival - apresentam-nos uma história de amor, fé e direitos civis que colidem numa cidade sulista, quando cristãos evangélicos e drag queens ocupam os holofotes, para assim desmantelar estereótipos num olhar pessoal, e muitas vezes cómico, sobre a negociação das diferenças entre religião e crença; em M, de Yolande Zauberman, passado em Bnei Brak, capital dos judeus ultraortodoxos, somos apresentados a Menahem Lang que em criança, impressionava todos com a sua bela voz ao interpretar cantos litúrgicos, mas que foi, no entanto, sistematicamente violado por membros dessa mesma comunidade que o admirava; Madame, de Stéphane Riethauser, também presente no Porto, é uma saga familiar com base em imagens de arquivo privadas, que propõe uma viagem íntima onde uma exuberante avó de 90 anos e o seu neto cineasta, exploram o desenvolvimento e a herança da identidade de género no seio de um ambiente patriarcal; em The Man Who Surprised Everyone, de Natasha Merkulova e Aleksey Chupov, Egor, um destemido guarda florestal na taiga siberiana, respeitado na sua pequena comunidade e à espera de um segundo filho, descobre que lhe restam apenas dois meses de vida e tenta desesperadamente enganar a morte tomando a identidade de uma mulher; em Los Miembros de la Familia, de Mateo Bendesky, com o objetivo de espalharem as cinzas da sua mãe no oceano, os irmãos Lucas e Gilda viajam para uma pequena cidade balnear argentina onde Lucas explora a sua sexualidade e os limites do seu corpo, enquanto Gilda procura algum significado para o mundo à sua volta; Raia 4, de Emiliano Cunha, fala-nos de Amanda, uma atleta de natação de 12 anos, calma e reservada, que procura segurança no seu próprio universo - debaixo de água, onde os segredos não podem ser ouvidos; e Yours in Sisterhood, de Irene Lusztig, onde, entre 2015 e 2017, centenas de mulheres, em comunidades de todos os Estados Unidos, foram convidadas a ler em voz alta e responder às cartas dos anos setenta enviadas à editora da Ms., a primeira revista feminista mainstream dos EUA. O prémio de Melhor Filme, no valor de 3.000€, é atribuído pela RTP2 pela compra dos direitos de exibição.
 
A par da Competição Oficial, o festival terá também a sua habitual Competição “In My Shorts”, constituída por filmes de escola portugueses, onde este ano participam alunos da Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha, da Universidade da Beira Interior, da Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa, do Instituto Politécnico do Porto e da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Portalegre. O filme vencedor recebe um prémio em equipamento vídeo, oferecido pela Much Underwear, no valor de 400€. Presentes no festival estarão as realizadoras de dois dos filmes selecionados nesta competição: Carlota Flor, que trará o seu Aurora e Tatiana Ramos, que vem ao Queer Porto com Jantar.
 
O Teatro Rivoli acolhe ainda um programa sobre Vídeo-Ensaios, um género que combina diferentes técnicas e que, abordando desde a crítica política até à perspetiva pessoal biográfica, é também uma forma já estabelecida no contexto académico e de abordagem artística onde, através da montagem, os autores encontram uma maneira de colocar na imagem em movimento os seus pensamentos e experimentar significados. Deste programa, destaque para filmes como Flow/Job, de Darren Elliott-Smith, com a presença do realizador no Porto, em que se faz uma análise estética dos filmes da icónica estrela de pornografia gay Joey Stefano em justaposição com a lendária curta experimental de Andy Warhol, Blow Job; ou International Face, de Natalie Tsui, uma meditação sobre raça, diásporas queer e sistemas de classificação de imagens.
 
Da programação do Queer Porto 5, fazem também parte os filmes escolhidos pela realizadora Cláudia Varejão, no âmbito da proposta de curadoria que a Agência da Curta Metragem fez este ano a vários realizadores e artistas portugueses, por ocasião do seu 20.º aniversário. Depois de estrear no Queer Lisboa 23, trazemos também ao Porto Agência 20 Anos: Carta-Branca a Cláudia Varejão, um programa que apresenta exclusivamente filmes realizados ou corealizados por mulheres portuguesas em que a curiosidade investigativa se faz diálogo com o território e a paisagem natural. Do programa fazem parte os filmes: A Torre, de Salomé Lamas; Insert, de Filipa César e Marco Martins; Paisagem, de Renata Sancho; Retrato de Inverno de uma Paisagem Ardida, de Inês Sapeta Dias; e Um Campo de Aviação, de Joana Pimenta.
 
O Queer Porto 5 apresenta ainda, em Sessão Especial, O Beijo no Asfalto, de Murilo Benício. A estreia na realização do conhecido ator brasileiro é uma releitura da peça homónima de Nelson Rodrigues, e conta a história de Arandir que, ao atender ao pedido de um beijo na boca feito por outro homem que está prestes a morrer, após ser atropelado por um elétrico, se torna matéria sensacionalista para Amado, um repórter que passa a explorar o “caso” para vender mais jornais. À exibição do filme segue-se uma conversa com o performer Tales Frey sobre a importância da obra do dramaturgo Nelson Rodrigues, e sobre a leitura que podemos fazer hoje deste texto dramático de 1961.
 
Tendo ainda por mote o filme de Benício, Tales Frey irá apresentar a performance O Outro Beijo no Asfalto, que faz parte da sua serie “Beijos”, uma intertextualidade com o clássico rodrigueano em que dois artistas, com trajes convencionalmente trocados, se suspendem num beijo de 30 minutos ininterruptos, e em que há a comprovação de que o preconceito é enorme quando a imagem traz uma conotação sexual ainda chocante num contexto moralmente conservador. A performance terá lugar na Praça D. João I, imediatamente antes da exibição do filme.
 
Nesta edição, o Queer Porto apresenta também A Terra é Tela, um trabalho de Vier Nev. À semelhança de anos anteriores o festival acolhe novamente práticas queer para lá dos ecrãs de cinema que artisticamente desafiam as noções estanques de géneros artísticos, nomeadamente com a utilização de tecnologias emergentes. Esta ‘exposição’ subverte o espaço público, convidando o utilizador da aplicação de realidade aumentada a passear nos espaços do festival e da própria cidade activando pedaços de histórias não normativas que se desvendam em esculturas feitas de bits e pixéis, a partir da pedra e azulejos da cidade. 
 
No Maus Hábitos, apresentamos este ano duas sessões Queer Pop. A primeira, intitulada Nos 50 Anos de Stonewall, parte do tema central desta edição do Queer Porto, e apresenta telediscos dos Bronski Beat, Le Tigre, RuPaul, e Troye Sivan, entre outros, refletindo sobre a evolução das expressões queer na pop durante os últimos 50 anos, culminado inevitavelmente no mais recente trabalho de Madonna, figura incontornável da cultura queer, pelo seu ativismo e pela construção de uma iconografia com fortes raízes nessa mesma cultura. Na segunda sessão, dedicada a Britney Spears, traça-se o percurso de uma das nossas estrelas pop favoritas, desde o seu começo no Club Disney até femme fatale obcecada com couro. 
 
À semelhança das edições anteriores, a noite de encerramento da 5.ª edição do Queer Porto sobe ao Maus Hábitos para uma Festa de Encerramento onde performance e música se misturam, celebrando o caráter experimental e único do festival na cidade do Porto. A noite arranca com Susana Chiocca, que é também júri nesta edição, e que irá apresentar o concerto/performance BITCHO, projeto musical em constante transformação desde 2012 e que, enquanto tal, permite ao espectador acompanhar as mutações de um ser feminino(?), animal(?), transanimal, ao longo de uma estrutura sonora, visual e textual. Depois é a vez de Catxibi, a persona musical de Luísa Cativo, também uma figura importante no panorama da noite portuense. Na mesa de dj a noite termina com João Vieira, o famoso DJ Kitten, como forma de celebrar quem, na cidade, marcou a noite com as famosas festas de culto do Club Kitten que, a partir de 2001, permitiram que o artista, a partir do Porto, reescrevesse a cena clubbing de Portugal.
 



Fonte: Queer Lisboa