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OPINIÃO


Amanda Coulson, VOLTA NY 2017. Imagem: Courtesia David Willems Photography


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira


VOLTA NY 2017. Fotografia: Sérgio Parreira

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ENTREVISTA COM AMANDA COULSON, DIRETORA ARTÍSTICA DA VOLTA FEIRA DE ARTE



SERGIO PARREIRA

2017-04-26




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Amanda Coulson é crítica de arte e curadora, sendo actualmente a directora artística da feira VOLTA em Basel, na Suiça, da qual foi uma das co-fundadoras em 2005. Escreveu para uma variedade de revistas de arte, incluindo a Frieze, Frieze d/e, Modern Paintings, Contemporary, Lápiz, Art Review e ARTnews. 

 

Por Sérgio Parreira

 

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SP: Quer destacar e enumerar o que faz com que a VOLTA seja diferente e especial comparativamente com outras feiras de arte?

AC: Eu diria que, para começar, foi uma feira criada por galeristas. Mesmo hoje, treze anos depois, nós pensamos nas galerias como audiência, de forma equiparada com os colecionadores e visitantes, e um grande número dos nos exibidores diz-nos que isto é particularmente raro. Este fator tem necessariamente um efeito na nossa interação e decisões criativas. Nós criamos profundas relações com os nossos exibidores e ouvimos o que têm para nos dizer, os seus conselhos e sugestões, do ponto de vista deles, do que funciona, e isto é crucial para a tomada estratégica de decisões. Acredito que como resultado desta interação, nunca tivemos outras galerias a julgar os nossos aplicantes. Deveria a Porsche decidir quem vai expor numa exposição automóvel? Não. Haveria claramente um conflito de interesse e poderia culminar num término de relações; naturalmente, os curadores tem os seus próprios interesses, mas nós acreditamos que com a sua colaboração e de outros profissionais das artes como consultores – em vez do galerista tradicional – conseguimos ter um ponto de vista mais abrangente e heterogéneo.

Considerando que é completamente impossível “curar” (curadoria) uma feira de arte, nós tentamos encontrar métodos para intervir neste processo com sucesso. Entenda-se que não o fazemos no sentido “Quem é o mais importante para o passarmos para a frente da lista”, mas no que respeita às obras que determinada galeria se propõe em trazer, e em como estas se irão relacionar com os da galeria na “porta” ao lado, ou no lado oposto.
Isto é naturalmente mais simples em Nova Iorque com o formato de apresentação “artista a solo”, o que só em si faz com que a VOLTA seja extremamente especial. Estou certa que se apercebeu que na sinalização de cada espaço expositor, nós colocamos o nome do artista primeiro – e em destaque na dimensão da fonte da letra – depois sim, o nome da galeria e a cidade de onde é oriunda. A ideia é naturalmente sublinhar a importância do artista e da sua participação, não descurando o espaço que o representa, a galeria. Às vezes ouço as pessoas a comentarem a feira em revistas e a dizer “Ah, esta vai ser uma boa/má feira”, e eu penso sempre: “Que raio! Como é que podem julgar sem sequer ter visto os trabalhos?”. Mesmo com galerias de topo, podemos ter más apresentações, e por vezes com galerias “desconhecidas” temos instalações extraordinárias. Quero com isto dizer que, por mais importantes que sejam as galerias, tudo o que fazemos não se foca unicamente nelas ou no seu nome.

A VOLTA é também especial pois mantemo-nos intencionalmente pequenos: somos uma equipa pequena e quase todos nós trabalhamos na feira desde a primeira edição ou estamos de certa forma associados a esta há mais de oito anos; começou como um negócio “Mom and Pop” (De um casal, marido e mulher), e nós sempre entendemos, independentemente do sucesso que viéssemos a ter, que queríamos que se mantivesse assim. O meu marido, Ulrich Voges, um dos cofundadores, ainda trabalha na feira e a nossa filha, agora com 14 anos, muito provavelmente vai fazer no próximo ano, um estágio de Verão connosco. Pode parecer um pouco “bimbo”, mas esta proximidade e laços entre os membros da equipa, e dos fundadores do negócio, traz-nos uma paixão e dedicação, que se sente na atmosfera e espírito do evento. Estou certa de que isto faz com que a VOLTA seja definitivamente diferente.


SP: 10 anos de VOLTA provam que o modelo está a funcionar. Não queria chamar-lhe modelo de negócio, mas acaba por o ser. O que acha que está a contribuir para este sucesso?

AC: Tem razão. Quando fundámos a feira em Basel (Há treze anos! A edição de Nova Iorque chegou este ano aos 10), nós pensámos que isto seria um projeto para 3 anos, e depois todos regressávamos aos nossos antigos negócios e trabalhos. Eu era crítica de arte, o meu marido era dealer de arte, o que significa que nós nunca pensámos em fazer da VOLTA um “negócio”. Acredito que o que faz da VOLTA um sucesso é também isso: Não estamos nisto com o objetivo primordial de “negócio”, mas sim para defender aquilo em que acreditamos: que um certo tipo de galeria – a que nos referimos habitualmente como “galerias mães” – merecem ter uma importante e significativa plataforma para alcançar a sua audiência; que excelentes artistas e excelentes galerias, devem ter um espaço fora de Nova Iorque, Berlim ou Londres; que as feiras de arte mais influentes, ao proporcionarem um espaço de acesso a blue-chip art (objetos de arte cuja proveniência é habitualmente garante de valorização: Ex. Picasso, Pollock, Wharhol, Hirst,…), podem ser repetitivas e seguramente que não serão o local ideal para novas descobertas. Estas são algumas das ideais basilares da VOLTA e às quais nos temos mantido e queremos manter fiéis. Tantos são os artistas que exibiram pela primeira vez na VOLTA e hoje estão na Frieze, Art Basel, The Armory Show… Depois de nós, são geralmente convidados por galerias mais influentes, mais conhecidas, com mais poder - isto é normal e é assim que o nosso ecossistema funciona – mas eu estou muito orgulhosa de termos dado às suas galerias originais, que os descobriram e os apoiaram nos seus primeiros anos, a oportunidade de os exporem e reclamarem essa titularidade. Isto é o que dirige o sucesso da VOLTA, os intrépidos amantes de arte e colecionadores – que não necessitam da aprovação do mercado para justificarem o seu gosto ou sentido estético – sabem que nós somos o local perfeito para fazerem descobertas com conteúdo.

 

SP: Consegue explicar-me quais são os critérios para produzir um evento como a VOLTA NY 2017? Como são as galerias escolhidas e se há um número de cidades ou países que devem estar representados? Como são escolhidos os artistas que estas galerias vão expor, ou se têm que se sujeitar a um processo de escrutínio. Genericamente, quais são os critérios de aprovação?

AC: De certa forma já mencionei acima alguns dos critérios. Ser uma “galeria mãe” é um deles. Ou seja, a galeria que apresenta determinado artista pela primeira vez. Já tive galerias que concorreram, por exemplo com um nome sonante de um artista, mas que o escolheram apenas pelo seu nome e após este ter tido algum sucesso. A galeria, depois não entende porque não é escolhida mesmo com um artista de renome, e habitualmente tem mais uma mão cheia deles, mas o que é verdade, é que não os apoiaram no início de carreira. Isto para dizer que nós reconhecemos e apoiamos a relação genuína de crescimento do artista com a galeria. É isso que valorizamos. Uma vez vi um “Statements” na Art Basel com um artista que eu sabia, que aquela galeria nunca tinha sequer apresentado uma exposição individual com ele; a sua “galeria mãe” tinha no entanto apresentado três exposições individuais suas, mas tinha concorrido 5 ou 6 vezes à Art Basel e nuca tinha entrado. Eu entendo, faz parte do sistema, a galeria que acabou por o representar, estava na moda e em consonância com o que as massas estavam a “consumir”… mas não é isso que a mim me interessa.

No que respeita a países e cidades: seguramente que queremos abranger o maior número possível, mas não é a razão primordial para selecionarmos uma galeria. Primeiro, excluímos todas as galerias que claramente não encaixam no perfil do programa (galerias a candidatarem-se com trabalhos de mercado secundário, por exemplo); depois olhamos para cada proposta unicamente em termos de conteúdo (isto é, que não apresente nenhum tipo de conflito que possa colocar em questão de integridade oposta ao conceito da feira: se a proposta é simplesmente má mas já temos uma longa relação com a galeria, pode colocar-se o caso de termos que telefonar e dizer “Epá, vocês tem que fazer melhor.” (embora não possamos avaliar, julgando por apresentações anteriores, mas somente aquilo que temos naquele momento à nossa frente). Uma apresentação com um caráter curatorial forte, revela-se extremamente importante. Galerias que nos enviam uma proposta com a lista de todos os artistas que tem em catálogo, não entram. Como vai ser o stand? O que estão a tentar comunicar à audiência acerca do seu trabalho enquanto galeristas? Depois de tudo isto ainda vamos ter galerias a mais para os espaços que temos disponíveis, e é aí que questões como as técnicas artísticas propostas e o país de origem podem jogar a favor ou contra a inclusão. Por exemplo: Podemos ter 80 propostas excecionais de espaços com pintura, mas não vamos querer ter uma feira só de pintura. Podemos excluir à partida todas essas e selecionar algumas propostas (com semelhante qualidade) de fotografia, escultura ou vídeo. Nós fazemos um esforço imenso para apresentarmos propostas de locais onde o mercado ainda é considerado como “emergente” – África, Sudoeste Asiático – embora, o simples fato de serem oriundas de uma região “exótica” não ser suficiente; a proposta obviamente tem que ser estimulante.


SP: Já tem números por parte das galerias no que respeita a vendas da edição deste ano em Nova Iorque?

AC: Sim e não. Claro que recebemos um balanço por parte das galerias no final da feira que nos possibilita ter uma noção grosseira, mas neste mercado – que está relativamente “brando” neste momento – os colecionadores levam mais tempo para tomar decisões. Eles sabem que têm tempo e que têm a possibilidade de negociar, o que pode fazer com que não saibamos com exatidão como a feira correu antes talvez, de seis meses, após o seu fecho. Já tive situações em que galerias no último dia da feira não tinham registo de vendas e após oito meses contataram-me a dizer que a feira se revelou um sucesso. Os dealers mais jovens esquecem-se que era assim que as coisas aconteciam antes do boom: têm expetativas de vender tudo durante os 4 dias da feira, o que é absolutamente irrealista. Isto não quer dizer que não tivemos galerias que venderam todo o seu stock… algumas venderam! Mas isto é a exceção que comprova a regra. Uma feira não gira apenas à volta das vendas, vive muito das RP (Relações públicas) e networking - trata-se de contatar com novos públicos com os quais se desenvolvem novas relações, e também estabelecer novos contatos com instituições. Há galerias que não venderam mas que asseguraram 4 ou 5 exposições em museus para os seus artistas; isto equipara-se a uma extensa exposição mediática que obviamente mais tarde se traduz em vendas… por isso, sinceramente, é muito difícil quantificar após estes dias. No entanto, e na generalidade, tivemos este ano uma excelente feira embora possamos claramente afirmar que os Estados Unidos estão a passar por uma mini-depressão (psicológica e financeira). O novo regime não é muito amigável (friendly) dos artistas e do mundo da arte em geral – cortaram recentemente o apoio nacional às artes (National Endowment for the Arts – NEA) – o que faz com que os artistas se sintam um alvo e os colecionadores não se sentem tão seguros para fazer grandes investimentos, num momento em que ninguém sabe ao certo qual será o curso da economia. Mesmo assim, momentos como estes por vezes revelam-se cruciais para a criação artística!


SP: Na sua opinião, qual é o perfil do comprador / colecionador que vai à VOLTA?

AC: O colecionador que vai à VOLTA tem um estilo aventureiro e confia no seu “olho” (Na sua visão). O meu marido costuma dizer, “Deves comprar arte com base no teu instinto, não com base naquilo que ouves”, e é este o tipo de comprador que habitualmente vem à VOLTA. Eu considero que as feiras de arte podem equiparar-se a diferentes lojas de roupa: tanto se pode escolher ir às compras em lojas de alta-costura – Chanel, Prada – onde sabemos que tudo é da mais refinada qualidade e à partida “aprovado” pelos gurus da especialidade, mas é extremamente caro; ou então vamos a uma boa loja no nosso bairro, que sabemos também estar a acompanhar as tendências, onde podemos correr no entanto alguns riscos (as roupas podem não ser tão duradouras e menos “trendy”), mas poupamos algum dinheiro; ou podemos mesmo optar pela “feira da ladra”, onde vamos ter que investir um pouco mais do nosso tempo e paciência para encontrar algo que contrabalance qualidade e preço, e que justifique no final o investimento. Eu gosto de pensar que nós nos encontramos na categoria da loja de bairro, em que tudo é escolhido pelo proprietário (ou manufaturador pelo estabelecimento), alguns dos designs são um pouco extravagantes ou escapam ao estilo comum, mas tudo é extremamente bem produzido e apresentado com atenção ao detalhe.


SP: Pessoalmente, eu acredito que quando apresentamos objetos de arte, devemos ter em consideração o espetador e a audiência em geral. Como por exemplo quando vamos a um Museu ou a uma galeria de arte. Considero que isto não acontece nas feiras de arte, e o que me surpreendeu na VOLTA NY este ano foi exatamente isso: Senti que eu, espetador, estava a ser considerado, e que a minha experiência era relevante para os organizadores do evento. Eu tenho consciência que a experiência na generalidade não se resume a mim, espetador, mas para também ao artista e os trabalhos que este apresenta. Também aqui considero que o modelo da VOLTA é exímio. Mas, o objeto de arte não “vive” sem uma audiência. Esta relação, objeto de arte/espetador/audiência é algo que considera importante? Fazer com que a VOLTA seja um espaço de contemplação e prazer? Digamos “art friendly”?

AC: Absolutamente! O que acaba de referir é uma das charneiras que guia o conceito da VOLTA e a abordagem que tentamos fazer com a exposição de arte e a apresentação dos artistas. A VOLTA original em Basel era ainda mais pequena – só tínhamos 23 galerias – tínhamos um barco que trazia os visitantes de outra feira para a nossa, eu chamava a este trajeto um “neutralizador de palato”, como que um interlúdio numa longa refeição gourmet de seis pratos diferentes. Em muitas destas cidades com semanas de arte – sejam elas Basel, Miami, Nova Iorque, Paris – existem tantas obras de arte, que os visitantes têm que refrescar as ideias e os olhos (e os estômagos!), e nós temos essa perfeita consciência. Também consideramos que é importante que a feira se relacione com a cidade em que é apresentada e proporcione ao visitante um todo enquanto experiência; centros de congressos são basicamente a mesma coisa em todo o mundo, assim como hotéis de cinco estrelas, e nós esquecemo-nos onde estamos; nós sempre quisemos que os visitantes reconheçam o local onde realmente estão, desta maneira também apreciam de forma mais consciente as obras, resgatando-os um pouco da aversão e potencial monotonia dos corredores intermináveis. Em Basel temos sempre locais com uma atmosfera local; VOLTA Halle e Ultra Brag (ambos acessíveis por barco através de um agradável passeio no Reno), o industrial Dreipsitz – atualmente a zona mais artística por excelência em Basel – e o icónico Markthalle, no centro da cidade; em Nova Iorque começámos por nos posicionar num espaço contíguo ao Empire State Building, depois fomos para o Soho e agora estamos em Hells Kitchen.

No nosso primeiro ano, perguntámos aos colecionadores: “Aparte da arte, quais são as três coisas mais importantes para si numa feira de arte?” - A resposta foi extremamente clara: “Locais para nos sentarmos, casas-de-banho limpas, e boa comida.” Tomámos isto muito a sério, e mesmo no nosso primeiro ano tivemos casas de banho portáteis com arranjos florais, cremes para as mãos e outros produtos ótimos; procurámos sempre ter excelentes restaurantes locais com chefs de renome a preparar refeições saudáveis e aprazíveis, e naturalmente com preços acessíveis; nós temos – sem qualquer dúvida – e estamos conscientes disso, uma audiência interessada e cativada, e precisamos necessariamente de fazer com que esta audiência se sinta Benvinda, num ambiente amigável e confortável, que os faça ter vontade de estar e ficar. Não queremos colocar o nosso visitante num espaço em que este sente a necessidade de comer algo e têm que pagar uma fortuna por uma má sandes. A luz exterior natural é também algo que consideramos crucial, caso contrário, é como colocarmos o visitante num desconfortável voo de longo-curso – a ver as mesmas pessoas a andar para trás e para a frente nos corredores, a respirar ar reciclado, sem noção das horas… isto torna-se extremamente desorientador e cansativo.

Também está certo quando diz que o visitante é um elemento chave: claro que tudo parte e termina no objeto de arte, mas se a nossa audiência, tem os pés e pernas doridas, está mal-humorado e enjoado da comida de reduzida qualidade com preços astronómicos (mau sushi, típico…), não estará seguramente disponível para apreciar arte ou os artistas que lhe estamos a oferecer - é absolutamente vital que o visitante se sinta bem recebido e que as suas necessidades básicas sejam agradavelmente facilitadas. Também é fulcral que a arquitetura do espaço seja pensada e considerada: intermináveis corredores, estilo “toca de coelho” em que se entra e perde a noção de como sair, não criam o espaço ideal de contemplação; precisamos de estudar espaços abertos, panorâmicos, na relação entre os stands – embora isto possa soar a senso comum – ter uma boa sinalização, não apenas para os stands mas para os serviços adicionais como, casas de banho, informação, outros espaços de lazer, etc. é fundamental. Já referi como nos focamos no artista na feira em Nova Iorque, mas esta questão de noção de localização é também algo muito importante. Pode parecer simples, mas garanto-lhe que é super comum os visitantes perderem-se dentro destes espaços, ou porque os mapas são maus ou porque a sinalética não é esclarecedora, e naturalmente que isto irrita o visitante.


SP: Na minha opinião, o conceito contemporâneo de feira de arte, como nos é apresentado na maioria dos eventos que acontecem atualmente, é extremamente estéril, por vezes agressivo e desinteressante. Considera que o espaço da feira de arte deve ser propositadamente concebido para incentivar o consumo e comercialização ou que em primeiro lugar deve ser um local expositivo?

AC: Bem, honestamente – como já tive oportunidade de referir – nós não conseguimos controlar curatorialmente toda a feira pois esta é composta por inúmeros elementos. No entanto, acredito que a exposição dos objetos de arte deve vir em primeiro pois se estivermos a ter uma experiência agradável – se o espaço que nos envolve, é acolhedor e “saudável” – as vendas e a comercialização acontece naturalmente, e abstemo-nos das vendas “à força”… é inquestionável que precisamos de proporcionar ao espetador o melhor espaço possível de contemplação, só com esta premissa ele conseguirá tomar decisões. Os colecionadores à partida, vêm predispostos para comprar logo não precisamos de os forçar a nada. Na feira em Nova Iorque, temos exposições individuais em cada um dos stands / galerias; no inicio, tivemos uma reação um pouco avessa por parte dos dealers: “Meu Deus, como vou desta forma vender os meus diversos artistas, não tenho espaço de manobra, nunca vou vender nada!” - Mas depois, e com o decorrer da experiência, todos concluímos que o formato funciona. Cada vez mais feiras estão a incluir o conceito de exposições ou projetos individuais em determinadas seções. Com este formato, os colecionadores tem a possibilidade de compreender em profundidade o corpo de trabalho de cada artista; Este dedica mais tempo a cada galeria e aprende mais. E, se um colecionador realmente gosta do trabalho de um artista no nosso programa, eles vão desenvolver uma relação com a galeria que o está a apresentar, olhando naturalmente para os outros artistas que a galeria representa. Já tivemos muitas pessoas a dizerem-nos que vinham à VOLTA – que é uma feira relativamente pequena – por uma hora só para ter uma ideia do que estávamos a apresentar, e acabaram por ficar 3 ou 4 horas pois o espaço proporciona-se a tal. Obviamente isto é bastante vantajoso para concretizar vendas. Já tivemos também visitantes que regressam após uma primeira visita alegando que precisam de respirar e fugir ao caos das outras feiras. Uma vez mais, isto é ótimo para as vendas… conclusão, fazer com que a arte e o espaço sejam acolhedores e agradáveis compensa e faz-nos atingir os objetivos desejados!


SP: Considera que há limites, no que respeita à forma como apresentamos objetos de arte, ou “vale tudo” desde que o objetivo seja alcançado – vender!?

AC: Eu considero que o objeto de arte tem que ser respeitado ao máximo, dependendo do contexto em que este está a ser mostrado. Às vezes vejo stands que são um género de “greatest hits” da galeria, em que os trabalhos não têm qualquer relação entre si. Eu não considero isto, uma apresentação satisfatória nem da galeria nem dos artistas, mesmo se isto acontece numa feira de arte. Talvez se isto acontecer numa feira principal, numa semana de arte, faça algum sentido – pois os colecionadores vão visitar o stand da galeria com a tendência para adquirir uma obra de cada artista representado por determinada galeria – mas na VOLTA algumas galerias são completamente desconhecidas, muitos dos artistas ainda se encontram numa trajetória ascendente, por essas razões eu digo às galerias que elas devem tentar ao máximo comunicar a sua identidade através do artista que vão apresentar. No seu espaço físico, na sua verdadeira galeria, é improvável que façam exposições com 8 artistas e obras sem qualquer tipo de relação – se o fizerem pode transparecer que estão só a tentar vender – eles ou fazem exposições individuais ou fazem exposições coletivas com uma curadoria cuidada, em que os trabalhos expostos respeitam um determinado contexto, e é exatamente isto que eu considero que uma galeria deve fazer numa feira de arte pois esta atitude vai transparecer a sua ética profissional. Apresentar uma exposição individual – numa galeria ou numa feira de arte – é um investimento tremendo, seja ele psicológico como financeiro; é uma mostra de confiança e comprometimento, e as galerias deveriam ser apreciadas por correrem esse risco que por vezes não tem qualquer retorno. Nós temos essa consciência e o sucesso da participação não é apenas por nós medido em vendas… um stand com um projeto curatorial adequado é extremamente importante!


SP: Eu gostava de lhe colocar agora uma pergunta que pode ser um pouco ingrata para responder e se achar necessário pode ser “politicamente correta”: Acha que temos colecionadores informados, ou seja, que sabem o que estão a comprar, ou que em vez disso são extremamente emocionais, e na maioria das vezes não fazem ideia do que estão a adquirir, o que acaba por criar uma perceção errática do que poderá ser ou não uma “boa” obra de arte? (Só para clarificar o meu comentário: eu tenho perfeita noção que é extremamente subjetivo nomear este ou aquele objeto de arte de “bom” ou “mau”, e que este julgamento pertence apenas à entidade que está a adquirir a obra, a apreciar o objeto, nos seus credos estéticos, e experiência pessoal.)

AC: Em primeiro lugar, e como disse “bom” é extremamente subjetivo. Há tantos géneros e estilos de arte e seguramente que há “bom” em cada um deles, se bem que determinado género ou estilo que pode não é apelativo para si, será eventualmente para outra pessoa. Claro que podemos identificar tendências: Arte conceptual é particularmente apelativa nos nossos dias o que não inviabiliza o fato de termos também hoje, excecionais pintores, ou reconhecidos escultores, mas claro que as tendências e modas influenciam as vendas. Os colecionadores aparecem-nos em todas as formas e feitios (metaforicamente). Há colecionadores extremamente cultos, outros super rigorosos e que fazem imensa pesquisa; há colecionadores cuja paixão se foca num estilo ou cultura particular (Arte Afro-americana; body-arte; arte concetual; novos media ou vídeo arte), que tem perfeita noção do seu gosto e colecionam de forma muito disciplinada; há colecionadores que gostam simplesmente de adquirir coisas; outros que apenas compram nomes associados às melhores galerias e querem nas suas coleções os artistas mais falados e publicitados… ou seja, é impossível generalizar. Seguramente que há grupos e indivíduos que ao adquirirem alguma obra específica vão fazer com que outros lhes sigam as pegadas, e essa movimentação vai gerar “conversa”. A minha opinião é que quando alguém coleciona deve pensar na sua relação pessoal com o objeto artístico; há que entender que vai passar a viver com essa obra, como que um parceiro para a vida, marido ou mulher, e isto é um compromisso; logo deve também confiar no seu instinto pois vai viver com ele todos os dias e cuidá-lo ao longo da sua vida. Na verdade os colecionadores estabelecem tendências mas as instituições também o fazem; talvez no passado as instituições tiveram mais influência – estavam dependentes dos patronos e colecionadores para terem financiamento – este fato esta a mudar e o poder está a começara a ser partilhado; se bem que um artista que é oficialmente reconhecido por uma instituição sofre de imediato um crescimento no seu percurso. Mais, não nos podemos esquecer dos críticos de arte: conteúdo e novidade são sempre um chamariz, os média têm um importante papel nestas nomeações, definem “tops”, listas, e escrevem histórias sobre as obras e os artistas que estão mais na “berra” ou que tendencialmente poderão vir a estar.


SP: A nossa conversa puxou-nos profundamente para o conceito de obra de arte e eventualmente o que deverá ser a arte enquanto experiência, e inevitavelmente vou ter que colocar-lhe uma questão um pouco ingrata… o que faz uma “boa” obra de arte?

AC: Uma vez mais, “bom” é extremamente subjetivo e é diferente de pessoa para pessoa. Cada uma tem expetativas diferentes da obra de arte. Algumas pessoas procuram beleza e tranquilidade, outras respostas para um pensamento filosófico, outras querem sentir-se desafiadas pelo objeto, e outras só querem mesmo algo simpático para colocar por cima do sofá. Eu acho que são sempre escolhas pessoais. Enquanto historiadora de arte (não enquanto dealer ou colecionadora), considero que devemos olhar para um objeto de arte e ter a capacidade de neutralizar o nosso gosto e julgar para além deste, dentro de cada estilo ou técnica artística. Por exemplo, eu não sou particularmente fã de Pop ou street arte, o que não quer dizer que não sou capaz de identificar o que poderá ser um bom ou mau graffiti numa qualquer estação de metropolitano. Numa pintura de paisagem – uma vez mais, não se trata do que possa ou não me interessar, mas não há qualquer dúvida que é possível distinguir o que é bom e o que não é tão bom. E isto não tem tanto que ver com a forma de execução mas sim com a descoberta e invenção do artista, “inventio” sobre “imitatio”, o que por exemplo, é a razão pela qual Bansky se tornou no fenómeno, porque fez algo de único, trazendo uma nova visão e criação para o formato que utilizava; ou Peter Doig com as suas paisagens. 
E agora no que respeita ao que é excecional na arte, é uma diferente questão. O que é que vai ser lembrado dentro de 200 anos? Quais serão os trabalhos que serão preservados pelos museus que os adquiriram… Isto levanta outra questão que é a motivação: os museus fazem aquisições a pensar nas suas nações, cidades e longevidade, o que significa que compram com critérios diferentes dos colecionadores, que naturalmente que têm uma paixão pelo objeto de arte, mas que o fazem para satisfazer um ímpeto pessoal.


SP: Como está a VOLTA a contribuir para toda esta experiência?

AC: É uma questão um pouco complexa. Uma vez um jornalista perguntou-me, como eu achava que estava a influenciar o mercado da arte, e honestamente, eu nunca tinha olhado para a questão dessa forma, estava apenas a seguir uma paixão, a fazer o meu trabalho, dentro dos meus pensamentos e convicções, a gerir os aspetos do dia-a-dia, sem qualquer pretensão em identificar se defino ou não um curso futuro com os meus atos. Mas claro que não sou naïve, e tenho consciência, agora, que a VOLTA influenciou ou está a influenciar de certa forma o mercado. Certamente que já tive galerias a reconhecerem que graças à VOLTA, que lhes deu uma base e plataforma, foram capazes de sobreviver e ainda hoje estar presentes no mercado. Por inúmeras razões antes de estarem na VOLTA não estariam a atingir a audiência indicada para os seus artistas, na cidade em que se encontravam… faz-me pensar se galerias que acabaram por não apresentar o seu projeto na VOLTA se tiveram que fechar… Há também da nossa parte uma certa aprovação de um determinado projeto ao permitirmos que este esteja presente na nossa feira, e uma vez mais, isto tem um efeito. Pegando uma vez mais no exemplo da moda: numa loja as roupas estão lá todas dispostas e disponíveis para serem apreciadas; ninguém está efetivamente a obrigar-nos a comprar seja o que for, logo não podemos afirmar que eles controlam o nosso gosto, mas ao não terem outros produtos para além daqueles que ali estão, existe uma proposta inerente. Mas nós fomos a esta loja e não a outra, estamos informados por revistas de moda, e é como nas feiras, as galerias vão para esta e não para outra, e nesta equação a VOLTA não é diferente. Eu gosto de acreditar que estamos a criar na VOLTA um espaço em que não é apenas comprar por “impulso” mas sim solicitar ao visitante que se informe, procure saber e envolver-se com cada projeto, e investir em relações, para si, com significado, sejam estas com os dealers ou mesmo com os artistas (muitos deles presentes na VOLTA!), ou as próprias obras de arte.


SP: O que pode o público esperar da VOLTA13 a acontecer em Basel este ano?

AC: Nós estamos a referir-nos a esta edição como a “Lucky 13”. A feira é mais pequena que a de Nova Iorque – ou seja, 70 expositores versus 90-95 na edição deste ano em Nova Iorque. O nosso espaço em Basel é notável: quando o Markthalle foi construído, manteve durante muito tempo o título de segunda maior cúpula suspensa da Europa (Edifício em Duomo), a seguir a II Duomo em Florença. A cúpula permite um espaço super arejado para os visitantes usufruírem das obras. Tal como em edições anteriores, mantivemos inúmeras galerias dos anos transatos, várias regressaram de outras feiras na Europa como é o exemplo da Martin Asbaek e a V1 de Copenhaga (cada qual com o seu projeto curatorial característico), Akinci de Amesterdão (com um projeto filmográfico do duo Persijn Broersen e Margit Lukács), a ADN de Barcelona (cujo projeto está muito relacionado com a Documenta Bienal), e a Conrads de Dusseldorf (cujo duplo projeto artístico se complementa entre Sven Druhl e Mounir Fatmi). Dito isto, eu continuo a acreditar que é fundamental manter uma visão global, e incluir também aqueles que estão a começar e a produzir um discurso novo, daí incluirmos sempre “sangue novo” na feira. Alguns dos novatos são T&L de Paris (com dois artistas emergentes, François Malingrëy e Tindar François), de Amesterdão a galeria Katwijk (com uma exposição individual de Niek Hendrix), e Charlot – sim, outra de Paris, temos umas muito boas! – Com dois artistas incríveis, Antoine Schmitt e Flavien Théry. E, super orgulhosa de confirmar que vamos ter excelentes galerias asiáticas nesta edição, de Quioto (COHJU Contemporary Art, com Kosei Komatsu e Michael Whittle), Taipei (Nunu Fine Art, com o artista Morgan O’Hara), Kuala Lumpur (Richard Koh Fine Art, com Hasanul Isyraf Idris, Anne Samat, e Yeoh Choo Kuan), e Hong Kong (Galerie Ora-Ora, com o artista Peng Wei). Ainda vamos ter a fantástica Cambojana artista Sopheap Pich, que vai expor na competição oficial deste ano da Bienal de Veneza e é trazida à VOLTA13 pela sua galerista de sempre de Nova Iorque Tyler Rollins Fine Art.

 

 

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Entrevista realizada a 28-03-2017.