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OPINIÃO


Rio Chicapa (Lunda), Julho de 1927. Fotografia: Isabel Machado


Planalto de Humpata, Outubro de 1927. Fotografia: Isabel Machado


Huaco (Lunda), Julho de 1927. Fotografia: Isabel Machado


Deserto do Namibe, Outubro de 1927. Fotografia: Isabel Machado


Coluna tabular, Julho de 1927. Fotografia: Isabel Machado


Canzar (Lunda), Julho de 1927. Fotografia: Isabel Machado


Objecto natural em exposição: Welwitschia mirabilis. Fotografia: Isabel Machado

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SERGIO PARREIRA

2016-12-13
A “ENTREGA” DA OBRA DE ARTE

ANA CRISTINA LEITE

2016-11-08
A MINHA VISITA GUIADA À EXPOSIÇÃO...OU COISAS DO CORAÇÃO

NATÁLIA VILARINHO

2016-10-03
ATLAS DE GALANTE E BORRALHO EM LOULÉ

MARIA LIND

2016-08-31
NAZGOL ANSARINIA – OS CONTRASTES E AS CONTRADIÇÕES DA VIDA NA TEERÃO CONTEMPORÂNEA

LUÍS RAPOSO

2016-06-23
“RESPONSABILIDADE SOCIAL”, INVESTIMENTO EM ARTE E MUSEUS: OS PONTOS NOS IS

TERESA DUARTE MARTINHO

2016-05-12
ARTE, AMOR E CRISE NA LONDRES VITORIANA. O LIVRO ADOECER, DE HÉLIA CORREIA

LUÍS RAPOSO

2016-04-12
AINDA OS PREÇOS DE ENTRADA EM MUSEUS E MONUMENTOS DE SINTRA E BELÉM-AJUDA: OS DADOS E UMA PROPOSTA PARA O FUTURO

DÁRIA SALGADO

2016-03-18
A PAISAGEM COMO SUPORTE DE REPRESENTAÇÃO CINEMATOGRÁFICA NA OBRA DE ANDREI TARKOVSKY

VICTOR PINTO DA FONSECA

2016-02-16
CORAÇÃO REVELADOR

MIRIAN TAVARES

2016-01-06
ABSOLUTELY

CONSTANÇA BABO

2015-11-28
A PROCURA DE FELICIDADE DE WOLFGANG TILLMANS

INÊS VALLE

2015-10-31
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2015-09-17
PARA UMA CONCEPÇÃO DA ARTE SEGUNDO MARKUS GABRIEL

RENATO RODRIGUES DA SILVA

2015-07-22
O CONCRETISMO E O NEOCONCRETISMO NO BRASIL: ELEMENTOS PARA REFLEXÃO CRÍTICA

LUÍS RAPOSO

2015-07-02
PATRIMÓNIO CULTURAL E OS MUSEUS: VISÃO ESTRATÉGICA | PARTE 2: O PRESENTE/FUTURO

LUÍS RAPOSO

2015-06-17
PATRIMÓNIO CULTURAL E OS MUSEUS: VISÃO ESTRATÉGICA | PARTE 1: O PASSADO/PRESENTE

ALBERTO MORENO

2015-05-13
OS CORVOS OLHAM-NOS

Ana Cristina Alves

2015-04-12
PSICOLOGIA DA ARTE – ENTREVISTA A ANTÓNIO MANUEL DUARTE

J.J. Charlesworth

2015-03-12
COMO NÃO FAZER ARTE PÚBLICA

JOSÉ RAPOSO

2015-02-02
FILMES DE ARTISTA: O ESPECTRO DA NARRATIVA ENTRE O CINEMA E A GALERIA.

MARIA LIND

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UM PARQUE DE DIVERSÕES EM PARIS RELEMBRA UM CONTO DE FADAS CLÁSSICO

Martim Enes Dias

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O PRINCÍPIO DO FUNDAMENTO: A BIENAL DE VENEZA EM 2014

MARIA LIND

2014-11-11
O TRIUNFO DOS NERDS

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2014-09-08
RUMORES DE UMA REVOLUÇÃO: O CÓDIGO ENQUANTO MEIO.

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Project Herácles, quando arte e política se encontram no Parlamento Europeu

Luís Raposo

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2014-05-06
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Rita Xavier Monteiro

2014-02-25
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Aimee Lin

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FILIPE PINTO

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FILIPE PINTO

2013-10-25
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FILIPE PINTO

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O LUGAR DA ARTE: O “CASTELO”, O LABIRINTO E A SOLEIRA

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GEDI SIBONY

SOFIA NUNES

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A AUTONOMIA IMPRÓPRIA DA ARTE EM JACQUES RANCIÈRE

PATRÍCIA REIS

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IMAGE IN SCIENCE AND ART

BÁRBARA VALENTINA

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WALTER BENJAMIN. O LUGAR POLÍTICO DA ARTE

UM LIVRO DE NELSON BRISSAC

2011-01-12
PAISAGENS CRÍTICAS

FILIPE PINTO

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TRINTA NOTAS PARA UMA APROXIMAÇÃO A JACQUES RANCIÈRE

PAULA JANUÁRIO

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O INFINITO PROBLEMA DO GOSTO

PEDRO PORTUGAL

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RE.ACT FEMINISM_Liubliana

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EMANUEL CAMEIRA

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MARTA TRAQUINO

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PORQUÊ CONSTRUIR NOVAS ESCOLAS DE ARTE?

MARTA TRAQUINO

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DA CONSTRUÇÃO DO LUGAR PELA ARTE CONTEMPORÂNEA I

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HONG KONG A DÉJÀ DISPARU?

PEDRO DOS REIS

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PEDRO DOS REIS

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A ARTE NA ERA DA TECNOLOGIA MÓVEL

SUSANA POMBA

2008-09-30
SOMOS TODOS RAVERS

COLECTIVO

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O NADA COMO TEMA PARA REFLEXÃO

PEDRO PORTUGAL

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BI DA CULTURA. Ou, que farei com esta cultura?

PAULO REIS

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V BIENAL DE SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE | PARTILHAR TERRITÓRIOS

PEDRO DOS REIS

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LISBOA – CULTURE FOR LIFE

PEDRO PORTUGAL

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VICTOR PALLA (1922 - 2006)

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TRANSNATURAL. DA VIDA DOS IMPéRIOS, DA VIDA DAS IMAGENS



MARCELO FELIX

2007-09-20




Uma das circunstâncias algo menosprezadas que ao longo do período de expansão colonial das potências europeias reforçaram a apreensão do mundo enquanto totalidade abarcável e exibível foi o interesse pela botânica. Um interesse que, para além das paixões que suscitava e das suas motivações económicas e científicas, e para além do universo prático das suas aplicações, da medicina à alimentação, da decoração à agricultura, se constituía como uma manifestação simbólica de poder. Na área modesta de um jardim botânico hospedava-se a diversidade biológica de um império; a sua extensão harmonizava-se numa estufa, a sua riqueza podia ostentar-se num herbário.

O efeito propagandístico destes microcosmos, elaborados para o estudo da ciência e para o lazer mundano, foi um motor importante do interesse que o poder lhes dedicava. A falta de atenção dos espanhóis à sua própria flora foi criticada por Lineu na obra “Fundamenta botanica” em 1736. O embaraço não teria alterado grande coisa se as recompensas políticas não incentivassem uma mudança de atitude. E Humboldt, o grande naturalista, podia notar em 1811 que a Espanha investia mais na ciência botânica do que qualquer outro governo. Com maior ou menor orçamento os países europeus, mesmo os que não podiam senão por procuração dar a ver o património de um império, equiparam-se com instalações botânicas e juntaram esforços na aventura da descoberta e classificação do mundo vegetal.

Esta confluência íntima do interesse político e científico, unidos numa dependência mútua de prestígio e financiamento, tornou-se um facto tão normal em qualquer empresa botânica que mencioná-lo é como chamar a atenção para os elementos arquitectónicos clássicos disseminados ao longo de um jardim: espera-se que estejam lá e sejam respirados tão naturalmente como a flora. E no entanto, é desconcertante vê-lo mesclado de maneira tão confusa que a parte científica parece perder o pé, em favor da acção de divulgação do império, tal como nos dá a ver o filme “Missão Académica a Angola – Alguns Aspectos Cinematográficos da Viagem”, produzido durante uma expedição do Instituto Botânico da Universidade de Coimbra “nas férias grandes de 1928/1929”. Este filme de Maximino Correia (que viria a ser reitor daquela universidade) integra a exposição “Transnatural”, comissariada por Paulo Bernaschina e Alexandre Ramires, patente até 31 de Outubro no Museu Nacional de História Natural.

“Missão Académica a Angola” parte da amplidão dos espaços do Jardim Botânico de Coimbra; mas está longe de reflectir a sistematização arrumada desse lugar inicial. Os membros da expedição acabam por empreender uma visita que decorre em abertura (um assinalar permanente e festivo da sua passagem, na partida de Lisboa em Agosto, na chegada a Luanda quinze dias depois, e daí em diante por numerosos locais de norte a sul da colónia) e em fechamento (pois a expansão do horizonte botânico jamais é sentida no pequeno filme documentário).

Tradicionalmente uma missão botânica devia albergar em si mais do que as instâncias da sua disciplina. Uma expedição destinava-se a conhecer ou reconhecer terreno. Integrando o testemunho das imagens, pedia-se-lhe que desse a ver o mundo. Talvez como pressuposto essa não fosse uma directiva muito clara. Tal como a missão, pelo testemunho do filme, gastava grande parte do seu tempo e energia em actividades de preenchimento de agendas de propaganda e relações públicas do Poder, também as imagens que ia recolhendo reflectiam um programa pouco definido, que aceitava a fotogenia dos lugares visitados sem tentar entreter com eles uma unidade mais consistente que a de pontos do trajecto. Entre o fascínio do exótico e a anotação do progresso nas suas paragens, as possibilidades do filme acabam por se retrair num tom geral de viagem de grupo, cujo interesse botânico é nulo. O que deixa, por contraste, todo um espaço que a parte fotográfica da exposição (de que o filme projectado é complemento) pôde ocupar: as imagens expostas de autor anónimo acrescentam ao registo de passeio oficial a observação efectiva do espaço humano e da natureza.

Cobrindo um percurso de alguns milhares de quilómetros, de Luanda a Moçâmedes (o actual Namibe) passando pelo Bengo, Cuanza, Malanje, Lunda e Huíla, as fotografias documentam momentos captados em Junho, Julho e Outubro de 1927. Ausente ou presente, o homem reforça a imensidão da paisagem, que faz o tema dos relances mais impressionantes: uma queimada na Lunda, uma miragem no deserto do Namibe, um embondeiro gigante no Dondo, junto ao Cuanza, as cataratas de Lucala, no Malanje, uma jangada no Lago Panguila, no Bengo, as cubatas no planalto de Humpata, no Huíla. Não é a botânica que predomina, mas as visões da excepcionalidade da terra visitada para a expedição metropolitana visitante. Aqui não há, ao contrário do filme “Missão Académica a Angola”, um ensaio de fotogenia preparando quem não domina a “arte do silêncio”. O efeito que produzem estas imagens, oito décadas volvidas, é o de uma evocação do silêncio com que a história que entretanto decorreu se ia aproximando deste mundo; os sonhos de progresso da escassa classe dirigente e a sua confiança, maior ou menor, nos destinos do império, são memórias absolutamente incorporáveis à fotogenia seleccionada: o embondeiro inabarcável, o terreno erodido, o carro afrontando um caminho de capim alto, a miragem no horizonte desértico. Nem na vida nem nas expedições existem certezas quanto ao verdadeiro estatuto de uma paisagem, e aquela não correspondeu senão transitoriamente à dimensão simbólica e política de que a queriam investida.

No entanto havia continuidade e lógica; a paisagem já tinha história e merecimento, uma e outro validados pela expedição, então velha já de quatro décadas, de Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens. Fora um passo na direcção que conduzia ao progresso, o das estações zootécnicas e plantações de cafés, das vacinações colectivas e caminhos de ferro. Se a realidade se distanciou das intenções, também as suas imagens perderam um carácter exemplar a ele associado, e órfãs do seu modo de percepção e produção, expõem-se hoje na sua precariedade de indícios de um projecto imperial. O que podem dizer agora é da sua fragilidade e da do mundo que as produziu, que foi um exíguo produtor e descuidado conservador de imagens, fixas ou em movimento.

São portanto objectos de memórias esparsas as fotografias de “Transnatural”. O seu estatuto, porém, junta uma adenda mais às significações múltiplas da exposição: se o regime destas imagens é difuso pelos acidentes económicos, ideológicos e históricos que as condicionam, o que dizer de quaisquer elementos que possam apresentar, quando furtados à condição de imagens e inseridos na realidade da exposição? É o que parece questionar a presença solitária, sem qualquer identificação ou nota explicativa, de uma welwitschia mirabilis. Um dos organismos vegetais de maior longevidade, ela parece mencionar a história como elemento de transformação da percepção e da vida das imagens, e da vida que elas captam, guardam e revelam. Sempre para um outro tempo.


Marcelo Felix
Cineasta