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ISABELLE FERREIRANOTRE FEUMAAT Av. de BrasÃlia, Central Tejo 1300-598 Lisboa 22 OUT - 02 MAR 2026
Xorieri mintzo zen, de Michel Labéguerie
Isabelle Ferreira, Ker, 2025 (pormenor). Foto: Guillaume Vieira, cortesia Fundação EDP.
Corte e costura. Rasgões de madeiras esculpidos, quase falsos, demasiado belos. Madeira craquelada, sofrida, epidérmica. Vestígios sobrepostos num jogo de cores texturadas. Há composições infalíveis, onde a ruína não é forçada, não é efeito ou finalidade – a tentação fatalista e ficcionante. Pedaço de madeira como mapa, painel de hipóteses. A anonimidade permite a projeção. Estalactites perfeitas. A procura de um rosto é revelada no final – série como um percurso que nos direciona até a um desconhecido descoberto. Agrafos rochosos, ornamentais – ajudam à caminhada. Madeira sublimada: a paisagem como bug vectorial. O orgânico torna-se digital. O mesmo processo nas pinturas conduz a uma intimidade obliterada na grande paisagem, envolvente, complexa. A madeira escarpada e afiada, assente num carrinho de mudanças, como numa loja de bricolage. Procede-se ao levantamento de peças: os vestígios de um trabalho manual. Os agrafos fixam um lugar concreto, inamovível. Procuram-se as partes do todo, o refazer das montanhas, sob o vento do tempo. A quebra, o intervalo. Controlo belo, sem exageros: o tom da madeira paralelo ao nublado do céu. Os tomos de madeira perfurados numa joalharia férrea e cintilante. Enraizamento, musgo, vivência, praga. A madeira polida e a madeira crua. Os agrafos alinhados materializam o caminho. Cobrem o pó e as cinzas. A vontade de serradura, ou de rarefação. Aderem à madeira, cada bloco como um mundo. Ao longe pareciam livros. A portabilidade das peças do mapa ventoso, trazidas ao ombro por corpos desaparecidos: o vivo é uma peça cromada, cristalizada, o signo de uma ausência. A gruta cavernosa do museu. Moldura xistosa sobre a clareza dos montes. Estabelecer o ponto de fuga. A vertigem de um apagamento. O ponto final. A noite escura. Cartolina pedregosa numa travessia árida e árdua.
Isabelle Ferreira, Ar, 2021, série “L'invention du courage (O salto)”, 2021-2025. Foto: Guillaume Vieira, cortesia Fundação EDP.
Percurso 2 Mão omnipotente de sibila, na procura de um rosto que conhece, fabricando a incógnita. A cor é traço de vida na caminhada. Há vasculuns vazios. O drama é belo e trágico. Sublime manual. Tátil extático. A crepetência da madeira nas montanhas rochosas. Um lugar de situação. Manchas na madeira paralelas, como que segmentadas ao mesmo comprimento, fazendo o painel. Agradeço o cajado. Para nós o vento bule. Ao longe. Retângulos perfeitos, escarpas simuladas. Andar em círculos, em busca do ponto de fuga. As plantas sugeridas são impossíveis em tamanha aridez. É esse o desenraizamento instaurado, que se pretende superar. O fogo apagou-se. Recuperemos o trajeto, com os sapatos possíveis. O vidro sempre opaco, inacessível à transparência. Obras fronteiriças, com obstáculos à saída. Binóculos para a paisagem. Correm rios negros, sonâmbulos, coagulados. Já a brancura agrafa o lugar de cada objeto. O corredor fecha-se. Encosto, sobreposição, fixação. Pariu-se uma pedra, frágil e lascada. Levamo-na no bolso. Chamamos-lhe democracia.
Isabelle Ferreira, Par la nuit (la vallée d'Ossau), 2025 (pormenor). Foto: Guillaume Vieira, cortesia Fundação EDP.
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Miguel Pinto
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