Links

EXPOSIÇÕES ATUAIS


António Sena, “Poème sur le désastre de Lisbonne (II)” (série “Cahiers de Voltaire)”, 2005-2006. 1 de 14 elementos de 29,5 x 21 cm [66 x 153 cm]. Técnica mista/papel


António Sena, “Poème sur le désastre de Lisbonne (II)” (série “Cahiers de Voltaire)”, 2005-2006. 1 de 14 elementos de 29,5 x 21 cm [66 x 153 cm]. Técnica mista/papel


António Sena, “Poème sur le désastre de Lisbonne (II)” (série “Cahiers de Voltaire)”, 2005-2006. 1 de 14 elementos de 29,5 x 21 cm [66 x 153 cm]. Técnica mista/papel


António Sena, “Poème sur le désastre de Lisbonne (II)” (série “Cahiers de Voltaire)”, 2005-2006. 1 de 14 elementos de 29,5 x 21 cm [66 x 153 cm]. Técnica mista/papel


Vista geral da exposição. Fotografia: Pierre Guibert

Outras exposições actuais:

JOANA VASCONCELOS

TRANSCENDING THE DOMESTIC


MICAS — Malta International Contemporary Arts Space,
CATARINA REAL

JOSÉ LOUREIRO

O DEFEITO PERFEITO


Galeria Fernando Santos (Porto), Porto
RODRIGO MAGALHÃES

JOANA VILLAVERDE

MY PLEASURE


Galerias Municipais - Pavilhão Branco, Lisboa
JOANA CONSIGLIERI

OLGA DE AMARAL

OLGA DE AMARAL


Fondation Cartier pour l’art contemporain, Paris
CLÁUDIA HANDEM

NAN GOLDIN

INTIMIDADES EM FUGA. EM TORNO DE NAN GOLDIN


MAC/CCB - Museu de Arte Contemporânea, Lisboa
PAULO ROBERTO

ERWIN WURM

ERWIN WURM. A 70TH-BIRTHDAY RETROSPECTIVE


Albertina Modern, Viena
CONSTANÇA BABO

BARBARA CRANE

BARBARA CRANE


Centre Pompidou, Paris
PAULO ROBERTO

FRANCIS BACON

HUMAN PRESENCE


National Portrait Gallery, Londres
THELMA POTT

TINA BARNEY

FAMILY TIES


Jeu de Paume (Concorde), Paris
CLÁUDIA HANDEM

JONATHAN ULIEL SALDANHA

SUPERFÍCIE DESORDEM


Galeria Municipal do Porto, Porto
SANDRA SILVA

ARQUIVO:


ANTÓNIO SENA

Cahiers. Books




FUNDAÇÃO ARPAD SZENES - VIEIRA DA SILVA
Praça das Amoreiras, 56
1250-020 Lisboa

14 JUN - 27 SET 2009


“Tout est bien, dites-vous, et tout est nécessaire.”
Quoi! L’univers entier, sans ce gouffre infernal
Sans engloutir Lisbonne, eût-il été plus mal?”


Voltaire, Poème sur le désastre de Lisbonne ou examen de cet axiome: «tout est bien», 1756



“Será que Deus não consegue compreender a linguagem dos artesãos?
Nem música nem cantaria.
Foi-se ver no livro: de um certo ponto de vista de:
terror sentido beleza
acontecera sempre o mesmo – quebram-se os selos
aparecem os prodígios”


Herberto Hélder, «Os Selos», Ou o Poema Contínuo, Assírio e Alvim, 2001



É pela poesia que conseguimos reconstruir o mundo, especialmente nesta cidade ameaçada por terramotos e inércia generalizada. Pela poesia em imagens, desenhos, frases - esboços de movimento - que abrem horizontes. Há em certos criadores, e felizmente ainda continuam a nascer alguns assim, esta capacidade de permitir abrir brechas no imaginário do espectador, e as formas são múltiplas: começamos a lê-los, a ver um plano de filme, a contemplar a pintura e conseguimos ver passado e presente que se desenrolam para além e durante as imagens. António Sena (Lisboa, 1940) é tudo isto, porque entre a imagem em cor e a letra que se anuncia e desaparece existe uma beleza absoluta.

Foram inúmeros os críticos, curadores, poetas e mesmo dramaturgos que escreveram sobre António Sena: Leonor Nazaré realça o carácter arqueológico da escavação nos tons argilosos da sua pintura; João Fernandes refere a singularidade desta obra radicar no permanente exercício de uma resistência às suas condições de legibilidade, sejam estas herdeiras de uma tradição pictórica ou literária; João Pinharanda, comissário desta exposição salienta a importância da pintura e do desenho em Sena, figura determinante na história de arte portuguesa desde 1960, pela sua intervenção gestualista e contemporaneidade gráfica (do grafite urbano, ao logo político e comercial). Sena participou em 1980, em “A Palavra e a Letra” no Pavilhão de Portugal em Veneza, sob a mão de Ernesto de Sousa: “Este simbolismo do elemento pictórico - gráfico está presente um pouco em toda a produção de Portugal antigo e moderno. E é talvez isto que permite que o país esteja presente e ao mesmo tempo ausente, explicitamente ou de forma velada, no grande contexto europeu”. Porém, o mistério permanece pois é difícil interpretar a sua obra. Talvez porque se feche a interpretações, basta vê-la e contentarmo-nos de que enquanto tivermos este escriba entre nós, o céu não pode engolir Lisboa.

Em 1965, António Sena, partiu para Londres, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, para frequentar a St. Martin’s School of Arts, cidade onde permaneceu cerca de 10 anos unindo-se a Lourdes de Castro e a René Bertholo no projecto de revista editado em Paris, KWY . Em 1975 volta a Portugal com o desejo de saber o que o vento da revolução teria soprado no seu país, mas cedo descobriu que a sua vida seria a de escritor solitário, que vê e lê a história e a política de forma omnipresente na sua obra contínua. Em obras como as “Sem Título” de 1969 e 1970 e posteriormente a série “Flags”, dos anos 80, a questão artístico-política é marcante. Ensina na Ar.Co entre 1978 e 1992 e após essa data dedica-se exclusivamente ao seu trabalho artístico. Em 2002 o Centro de Arte Moderna dedica-lhe a exposição antológica “António Sena – Pintura” e Serralves, em 2003, “António Sena: Pintura, Desenho (1964 – 2003)”. Tal como Herberto Hélder (Funchal, 1930) também António Sena começou a sua obra sob o apelo surrealista tardio ou mesmo dadaísta e actualmente é na sua faceta de desenhador incansável e copista e apagador que trabalha.

Penso em Herberto Hélder, outro dos nossos cantores, que refugiado nos Açores cura o delírio dos dias com a sua poesia contínua, que auto-denomina de ofício cantante.

Books/Cahiers é talvez o título perfeito para uma visão de exegese antinómica do mundo; entre o diário íntimo (cahier) e o livro aberto (book), entre o texto monoteísta da Génesis e a crónica política e agnóstica de Voltaire, entre um iluminismo filosófico humanista e um livro sagrado monoteísta. A leitura/visão das suas obras faz-se - entre - num cruzamento da visão entre processos criativos - cor, mancha e caligrafia - num palimpsesto. Sendo a técnica do palimpsesto a de voltar a escrever sobre o que já fora escrito, apagar, raspar, desde o tempo do pergaminho. Pergunto-me se será a escrita inicial de Sena ainda decifrável, ou é propositadamente semi-apagada deixando aos eleitos a leitura impossível do todo.

Esta exposição encontra-se na pequena sala do rés-do-chão do Museu Fundação Vieira da Silva-Arpad Szenes, e basta entrar no espaço para ver que a qualidade pictórica do conjunto das duas séries de trabalhos é impressionante, não por ter os girassóis de Van Gogh a iluminar a divisão mas por sentirmos que estamos a entrar na antecâmara do tumulo do faraó Tutankhamon, como arqueólogos privilegiados. As séries estendem-se pelas quatro paredes da sala, com a sua linguagem cromática e legível/ilegível. Não será por acaso, que Jorge Silva Melo defensor no final dos anos 90 da linguagem incompleta na dramaturgia teatral contemporânea, da frase que começa sem nunca terminar, tenha escrito e realizado um filme sobre o artista, que apelida de “rabiscador imparável”.

Porém voltamos a ler algures na exposição: “Rien le livre du sort se ferme à notre vue”.



NOTA:
Os Artistas Unidos produziram um filme documentário intitulado “António Sena: A Mão Esquiva” (2009), realizado por Jorge Silva Melo, que acompanha o labor do artista desde a retrospectiva que lhe dedicou o Museu de Serralves em 2003 até à preparação da exposição “Cahiers. Books” na Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva. Um simples e cuidado catálogo bilingue foi editado pela FASVS e pela editora Assírio & Alvim, com textos de João Pinharanda, Vasco Graça Moura e Marina Bairrão Ruivo.


Sílvia Guerra