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JORGE SANTOSA ILUSÓRIA VERDADE![]() GALERIA QUATTRO Rua Cidade Tokushima, lt. 1, Loja 1 2400-119 Leiria 17 OUT - 15 JAN 2021 ![]() ![]()
Existe por vezes uma ilusão desvirtuada, muito provavelmente fundada na perceção individual do consumidor ávido de arte contemporânea – entre os quais me incluo - de que os trabalhos que um artista hodierno apresenta numa exposição hoje, são necessariamente obras recentes. Isto não é seguramente verdade e nunca foi forçosamente um requisito para aferir atualidade, espectro, qualidade ou pertinência de uma mostra artística. Jorge Santos (Silves, 1974) apresenta atualmente uma série de dez desenhos em papel, intitulada Les Amants, 2012 (Os amantes), duas pinturas em acrílico e quatro gravuras da série Flower Ornament, 2014, na Galeria Quattro em Leiria. Esta exposição denomina-se “Ilusória Verdade” e verte precisamente a asserção da minha nota introdutória. Em 2012, o artista foi convidado a realizar uma residência de pouco mais de um mês no espaço La Petite Escalère (LPE) em França, que se encontra localizado nos bancos do rio Adour em Bayonne. Jorge Santos inaugurou em 2012 conjuntamente com a artista franco-suíça Christine Crozat o programa de residências desta organização, reconhecida atualmente pelo ministério da cultura francês e pela federação francesa de residências artísticas. Neste local idílico, e do trabalho desenvolvido durante a sua estada, resultaram duas séries de trabalhos, nomeadamente Blacklight Dahlias e Les Amants, e ainda a produção de uma escultura/instalação site-specific Arc-en-Ciel que se encontra até hoje nos jardins da LPE e que ficou a fazer parte da coleção de escultura moderna e contemporânea da La Petite Escalère. Os trabalhos que Jorge Santos apresenta em Leiria, refletem uma experienciação romântica que o artista acolheu de forma genuína, pura e legítima, ao se entregar a um isolamento criativo intemporal, que unicamente um espaço de natureza activa protegida, se revela apto a germinar. Num texto de apresentação da sua série Blacklight Dahlias, Jorge enuncia de forma exemplar a provocação que lhe fora então proposta, o habitar deste lugar criativo: “Nele encontrei um lugar de isolamento povoado por arte maioritariamente modernista e algumas peças contemporâneas, assim como inúmeras referências visuais do lugar, que me remeteram para vários universos de diversos artistas como Magritte, Lygia Pape, David Hokney, Brancusi, Ian Hamilton Finley, Jorge Oteiza e Paul Morrison.”
Les Amants. Desenho, caneta de gel e acrílico em papel, 2012 (Série 10 Desenhos: 5 desenhos 76x56cm e 5 desenhos 100x70cm)
A série de desenhos Les Amants, são trabalhos em caneta de gel branco e acrílico, sob um fundo negro, em papel. Estes desenhos, numa primeira instância, aparentam tratar-se de impressões através de uma técnica de gravura. No entanto, as linhas que enunciam a vegetação, o bosque, a penumbra, o movimento indistinto, mas tranquilizante de uma natureza, são rasgados num ato de coragem, através da simplicidade de uma caneta de gel branca. Num evidente recato no uso da linha, o esboço final oferece uma mensagem, que apesar de misteriosa e sombria, comunica de forma translúcida registos de memórias, momentos vislumbrados e ainda, prenúncios de temor e incertezas. É notória nestes desenhos, a antecipação das referências anunciadas pelo artista; das perspetivas sinuosas das representações da natureza de Hockney, passando pela intenção do registo da sombra das linhas de Lygia Pape, ao enunciar da ilusão e do potencial fantástico de Magritte. Numa visita recente ao estúdio do Jorge Santos, tive a oportunidade de folhear um extraordinário livro de artista repleto de desenhos e inscrições realizadas durante este mês que o artista passou em residência na LPE. Este livro privado, desenhado, riscado, pintado, catálogo de reminiscências, arte e ideias, não só imortalizou um período de criação, como esboçou o trabalho oportunamente visível e projetou sequentes criações.
Arvoredo. Tinta de acrílico em papel, 2014, dimensões variáveis.
Nesta exposição na galeria Quattro, Jorge Santos mostra ainda duas pinturas em acrílico das suas séries Arvoredo e quatro gravuras em tinta dourada sob papel, que a curadora da exposição Lourdes Féria resume de forma distinta: A memória de uma humilde caixa de chá em latão com relevos côncavos no interior e as letras verdes em evidência encontra-se na base dos trabalhos das flores douradas de Jorge Santos que, fascinado pela geometria e a divisão do espaço, pensou logo “num jardim”. Em “Ilusória Verdade”, Jorge Santos expõe trabalhos de múltiplas fases de criação que, ao contrário do que se possa antever, e não sendo trabalhos recentes, assoalham intemporalidade, à semelhança da natura capturada; e enquadram uma narrativa estética sólida, presente, que revela a asseveração de uma exploração plástica perene.
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