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EXPOSIÇÕES ATUAIS


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Tânia Dinis, Sem título, 2015


Narcissister, Hot Lunch (2009)


Beth Moysés, frame de Memória do Afeto - São Paulo, 2000


Luiz Roque, frame de Ano Branco, 2013


Vista da exposição. Fotografia de eRevista Performatus


Vista da exposição.

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THE CONTRACTION OF EIN SOF


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CLÃUDIA HANDEM

ARQUIVO:


COLECTIVA

TRABALHA-DORES DO CU




MAUS HÃBITOS - ESPAÇO DE INTERVENÇÃO CULTURAL
Rua Passos Manuel, 178, 4º
4200-382 Porto

26 AGO - 13 SET 2015

Como se ser já não fosse difícil o bastante

 

Em 1848, na Europa industrializada, ecoava um chamado aos proletários do mundo: “uni-vos!”. Mais do que uma frase consagrada, o que pretendemos evocar é o espírito de subversão da ordem política que nele repousava. Convocação intensa e potente o bastante para desviar trajetórias históricas, sociais, culturais e políticas no continente europeu e também muito além de suas fronteiras, ao mesmo tempo, que eternizou àquele breve manifesto de onde ela ressoou. O manifesto, como forma textual, inscreve-se muito facilmente como texto-ferramenta que, longe de descansar tranquilamente em prateleiras, salta sobre mesas de trabalho, invade oficinas e se lança à rua como objeto vivo e ansioso.

Essa é a potência daquele manifesto e essa também é a do manifesto contrassexual do filósofo espanhol Paul Beatriz Preciado. Não podemos prever − nem pretendemos, pois isso seria justamente tentar matá-lo − nem para que lugares nos levará as pouco mais de duas centenas de páginas do autor, nem quantos subscreverão o modelo de contrato nele proposto. É, todavia, precisamente esta a sua força: abrir violentamente passagem por entre a normatização empobrecedora vigente rumo às outras possibilidades de ser em devir.

As respostas ao chamado do texto de Preciado já se escutam e, em alguns casos, veem-se e sentem-se, pois concretizam ações estético-políticas. A exposição coletiva Trabalha-Dores do CU inaugurada no último dia 26 de agosto no Espaço de Intervenção Cultural Maus Hábitos na cidade do Porto é, sem dúvida, um panfleto artístico e político por excelência, o qual reúne, sob a curadoria de Paulo Aureliano da Mata e Tales Frey, fotografias, vídeos, performances e objetos capazes de colocar em xeque a divisão binária e normativa da sexualidade.

Essa mesma divisão que é mitigadora, segundo a qual tudo que está fora do padrão é um problema a ser minimizado e cujo resultado é a conversão da sexualidade meramente biológica em identidade essencial dos sujeitos, empurra para a borda e para a sombra todo comportamento desviante como abominação. Como descrevem os curadores, essa exposição-panfleto se trata de trazer o cu para o discurso como meio de fugir ao discurso hegemônico binário e redutor, não como forma de instituição de um terceiro gênero, mas antes como forma de ultrapassar os limites da própria (hetero)normatividade, a qual determina, sobretudo, para além dos comportamentos sexuais aceitáveis, os arranjos sociais e culturais, consolidando formas de opressão e de intransigência sustentados justamente no conceito de gênero. Conceito este que apaga, de forma conveniente e convincente, as marcas de criação políticas que todo conceito possui, dando a falsa ideia de que é um conceito neutro.

A seleção de trabalhos que nos propõe da Mata e Frey encontra seu maior feito, para nós, em forçar, todo o tempo, que o conceito de gênero se mostre naquilo que é, ou seja, parcial, delimitador, limitado e, portanto, excludente por definição. Bem como escapam com eficácia dos discursos de afirmação positiva dos gêneros subjugados; não se trata de propor uma ação afirmativa de gêneros contra-hegemônicos, mas sim despir a noção de gênero em si, desnudando o que nesse conceito persiste de perverso.

A exposição conta com trabalhos de vinte e quatro artistas e, em sua inauguração, ocupou o Maus Hábitos também com diversas ações ao vivo. A seleção dos curadores nos confronta com os aspectos morais e religiosos dos corpos subdivididos no par “homem/mulher”, ressalta a força política e os modos do Estado ratificar e reforçar tais identidades como as únicas legal e socialmente válidas, nos falam de corpos culturalmente domados e de vidas aniquiladas.

Poderíamos evocar, como metáfora ideal da crueldade dos sonhos identitários incentivados pelos padrões heteronormativos, o vídeo de Beth Moysés, Memória do Afeto – São Paulo, com seu sombrio cortejo de noivas. O conto de fadas em que meninas de grande parte do mundo ocidental são ensinadas a tornarem-se “mulheres” possui exatamente o mesmo tecido dos sonhos; muitas vezes, desmancham-se em desilusão, em violência, em culpa, deixando pelo caminho corpos dilacerados. Assim também opera esse regime normativo, o qual deixa para trás inúmeras(os) indivíduas(os) despedaçadas(os) pela impossibilidade de serem aquilo que é esperado delas(es). Ao poder ser apenas aquilo que são, estão sempre aquém do desejável. Como se ser já não fosse difícil o bastante.

 

 

 

Suianni Macedo

É mestre em História da Arte Portuguesa pela Universidade do Porto. Atualmente é doutoranda em Educação no Laboratório de Estudos Audiovisuais (OLHO) da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas onde desenvolve uma pesquisa acerca da visualidade e da educação estética dos indivíduos como aspecto fundamental da compreensão da realidade a partir de produções audiovisuais sobre a cidade de São Paulo.



Suianni Macedo