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© Julia Ugelli
Entre o real e o simbólico, o Museu de Arte Contemporânea Armando Martins (MACAM) inaugurou, a 10 de outubro de 2025, Juliet and Juliet, uma instalação da artista portuguesa Isabel Cordovil, com curadoria de Carolina Quintela. A obra ocupa o Grande Hall do museu até 2 de março de 2026, integrando a segunda edição do projeto MURMUR - um programa dedicado a intervenções criadas especialmente para o espaço do MACAM, em sintonia com a arquitetura e o público.
Inspirando-se em Julieta, de Romeu e Julieta de William Shakespeare, Isabel Cordovil propõe uma reinterpretação radical da protagonista, libertando-a do destino trágico e da narrativa romântica que a cristalizou no imaginário coletivo. A artista toma como ponto de partida a fala marcante “nega o teu pai e renuncia ao teu nome” para revelar a força da linguagem como ato de autonomia, um gesto que desafia heranças, normas e identidades impostas.
Em Juliet and Juliet, a icônica varanda de Verona reaparece duplicada, abrindo espaço para a existência de duas Julietas que se olham, se espelham e se reconhecem. Entre elas, um delicado fio liga dois copos de iogurte, um dispositivo simples, quase infantil, que evoca tanto o desejo de comunicação quanto a fragilidade do encontro. Essa imagem de duplicação e diálogo convoca o amor como força transformadora, não apenas relacional, mas também interna: amar o outro e amar-se tornam-se expressões inseparáveis de descoberta e reinvenção.
© Julia Ugelli
A instalação habita uma ambiguidade profunda: pode ser lida como a representação de um vínculo entre duas mulheres, ou como a metáfora de um ser que se descobre em si mesmo, em busca de autenticidade e liberdade. Ao propor duas varandas e duas vozes, Cordovil reconfigura o mito de Julieta em um espaço de alteridade, onde a identidade é fluida e o amor se afirma como resistência ao convencional.
Com entrada gratuita, Juliet and Juliet convida o público a atravessar as fronteiras entre palavra e imagem, e entre nome e essência, bem como a escutar, nesse murmúrio de ecos e espelhos, o amor enquanto manifestação de verdade, criação e desprendimento.
Por Julia Ugelli
© Isabel Cordovil