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EXPOSIÇÕES ATUAIS


Vista da exposição. Cortesia Kubikgallery.


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Vista da exposição. Cortesia Kubikgallery.

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ARQUIVO:


VALTER VENTURA

LUNÁRIO




KUBIKGALLERY
Rua da Restauração, 2
4050-499 Porto

19 FEV - 26 MAR 2022

O Lunário de Valter Ventura. Calendários, coleções e constelações na Kubikgallery

 

 

Valter Ventura expõe na Kubikgallery, de 19 de fevereiro a 26 de março, um conjunto de obras que nos é particularmente próximo. Embora grande parte do seu trabalho tenda a comportar um caráter relacional, sobretudo considerando que os seus objetos de reflexão, problematização e experimentação estética se debruçam, frequentemente, sobre questões tais como a condição humana, a memória e o sensível, a sua mais recente criação emergiu e desenvolveu-se num período de exceção transversal a todos, i.e., a pandemia global.

Foi, aliás, durante o primeiro confinamento que Valter deu início a uma produção artística que, sendo fundamentalmente sustentada no real, no comum e no quotidiano, quanto na natureza, é, simultaneamente, passível de nos transportar para o universo onírico. Como se pode observar, inúmeras das suas mais recentes fotografias, cujos elementos representados são-nos, na sua maioria, comuns e reconhecíveis, compõem-se de enquadramentos, cores e jogos de luz convidativos e propícios a estimular o imaginário. Em certa medida, terá sido de um modo semelhante que, em vários momentos destes dois últimos anos, os frames das nossas janelas nos permitiram viajar para lá da circunscrição das nossas casas.

Ora, nesse preciso contexto, Valter, movido pelo seu impulso tão criativo quanto arqueológico, recorreu à câmara fotográfica para observar, registar e capturar elementos do exterior. Até porque, fotografar não é somente ver, mas é, também, agir e sentir. A experiência do visível liga-se, pois, à do físico e à do psicológico, como o provam as imagens que agora se expõem, condutoras de experiências estéticas plurais e sensitivas.

O título da exposição Lunário não evoca então, somente, os calendários lunares, ou seja, o registo do tempo de cada quarto de Lua do ano, as luas de um ciclo lunar, os movimentos cíclicos do planeta satélite sobre si mesmo e o que exerce em torno da Terra, ou mesmo as significações que a estes fenómenos são associadas, tais como o ciclo da vida. Como Valter explica, Lunário é, também, alusivo a outros ciclos naturais, tais como o nascer e pôr-do-sol e o crescimento das plantas do seu jardim, os quais se tornaram objetos da sua mais atenta observação, bem como os pequenos rituais cíclicos do dia-a-dia, desde logo, do acordar ao adormecer. Paralelamente, como observa o artista, o ciclo define-se pela repetição, metodologia que destaca ser fundamental no seu trabalho. Como nos explica, criar, produzir e expor, tal como listar, arquivar e colecionar, são repetições estruturais da sua criação artística. Destacamos, também, a prática fotográfica, constitutiva de uma execução contínua de um mesmo conjunto e ordem de passos: olhar, focar, disparar, revelar.

É, pois, justamente através de um processo de repetição que Valter concebeu as quatro peças Lua Nova, Lua Crescente, Lua Cheia e Lua Minguante. Num exercício meticuloso, os títulos foram repetidamente impressos em papel pela máquina de escrever, de forma a cada um compor a sua correspondente fase lunar. As palavras transfiguram-se, assim, em imagens e adquirem novas objectualidade, fisicalidade e expressão visual. Assinala-se que o instrumento escolhido pelo artista redefine a materialidade da escrita e reduz caracteres a sinais abstratos. Assim nos explica Kittler, em Gramophone, Film, Typewriter (1999), obra na qual o teórico também identifica na máquina de escrever a capacidade de subtrair a ligação física entre o texto e o livro, e de mecanizar a produção da linguagem. Acrescentamos, ainda, que o dispositivo exerce a função de um mediador, não somente entre os objetos, mas também entre autor e obra, e espectador e obra, em semelhança à fotografia. Os dois instrumentos divergem, porém, sobretudo considerando que, ao contrário da máquina de escrita que desaparece após a sua ação, a câmara fotográfica confunde-se e funde-se no que apresenta, revelando-se, sempre e primeiramente, a si mesma.

Não obstante, a fotografia é capaz da mais fidedigna representação, razão pela qual Valter a elege enquanto a sua ferramenta para registar e colecionar. É, precisamente, do ímpeto e do desejo de arquivar que nascem inúmeras das suas obras, nomeadamente as que agora se expõem e que, enquanto um todo, compõem o que consiste numa mostra do seu acervo, ou mesmo, poderá dizer-se, património. Por conseguinte, embora a sua mais recente obra decorra de um período e de uma situação universais, é profundamente pessoal. Refira-se a série de pigmentos de cebola, brócolos, romã, buganvília, roseira, figueira e terra, que provêm da horta do artista, os quais se desvelam em tons fortes e vivos. Apresentados sob o formato de provas cromáticas, assim se relacionando formalmente com as samples da Munsell que encerram a exposição, os fragmentos hortícolas destacam-se na medida em que ativam a memória e os restantes sentidos para além da visão, desde o odor ao palato e, mesmo, ao toque.

É também do jardim do artista que provém uma série de penas de diferentes espécies de pássaros, as quais, tal como as folhas de árvores que, sob fundos negros, se expõem na primeira sala da exposição, foram recolhidas e tratadas enquanto objetos de rigorosa investigação científica. O resultado é de elevada beleza e equivalente nível estético. Convergem, assim, a ciência e a arte, união que se materializa por meio de artefactos naturais e facsimiles dignos de um Wunderkammer, ou Kunstkabinnet (gabinete de curiosidades) do séc. XVI. Para tal, também contribuem as composições e molduras definidas pelo artista, bem como o trompe-l’oeil proveniente não só da qualidade da reprodução imagética, como da impressão de jato de tinta sobre o papel de algodão texturado.

Simultaneamente, é no contexto das paredes das galerias da Kubik que estas peças ou pequenas maravilhas, enquanto obras de arte, estabelecem múltiplas relações e diálogos, criam narrativas e ganham novas significações. São, pois, objeto de renovadas visibilidades, leituras e interpretações, proporcionando também várias e singulares experiências, especialmente ao nível do imaginário. Até porque, como afirma Valter, “um objeto é uma coisa que está solitária, como uma estrela, mas junto com outros objetos forma uma constelação que não é mais do que um produto da imaginação”.

 



CONSTANÇA BABO