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2006-08-17
BAS JAN ADER, TRINTA ANOS SOBRE O ÚLTIMO TRAJECTO

JORGE DIAS

2006-08-01
UM PERCURSO POR SEGUIR

SÍLVIA GUERRA

2006-07-14
A MOLDURA DO CINEASTA

AIDA CASTRO

2006-06-30
BIO-MUSEU: UMA CONDIÇÃO, NO MÍNIMO, TRIPLOMÓRFICA

COLECTIVO*

2006-06-14
NEM TUDO SÃO ROSEIRAS

LÍGIA AFONSO

2006-05-17
VICTOR PALLA (1922 - 2006)

JOÃO SILVÉRIO

2006-04-12
VIENA, 22 a 26 de Março de 2006


PORQUE É QUE A ARTE PORTUGUESA FICOU TÃO PEQUENINA?



PEDRO PORTUGAL

2021-08-17




 

 

Entre os anos 60 e 90 do séc. XX houve um simulacro de mercado de arte em Portugal. Pelas fotografias, vemos que as inaugurações nas galerias e museus estão cheias de gente e qualquer pintura que um artista fizesse era notícia num jornal nacional. As galerias vendiam, os artistas ficavam contentes, os colecionadores entusiasmados e os museus felizes.

O que aconteceu? Porque é que o mercado de arte em Portugal diminuiu como os crânios encolhidos tsantsia dos índios Jivaro na Amazónia?
A parábola adapta-se assim: primeiro decapita-se o artista português, vivo ou morto (o resultado é idêntico). A cotação é depois cozida durante horas até ficar com metade do tamanho. Vários tráficos operam o encolhimento até a arte do artista português não valer nada. Os índios são as leiloeiras, que nos últimos 20 anos demoliram a cotação dos artistas portugueses (vivos e mortos) com vendas a granel, lotes com preços irresponsáveis, avaliações discricionárias e outras malfeitorias — sem regulador ou princípios. São os próprios selvagens das leiloeiras a atestar que, depois de morto, a cotação do artista português cai gloriosamente a pique.

Chegam a leilão obras a preço muito inferior àquele a que o artista as vendeu na galeria há 20 ou 40 anos. Consequência: o colecionador sente-se aldrabado e os ricos passaram a comprar, através de dealers na Sotheby´s, artistas com cotação e valorização garantida e a guardar o investimento diretamente no Free Port de Genebra, livre de impostos.

A 20 Setembro de 2008 a Lehman Brothers abriu falência. 5 dias antes um artista levou a leilão, pela Sotheby’s em Londres, 223 lotes e faturou 122M € (muito abaixo do estimado). Num só dia, o artista ganhou mais do que todos os artistas representados na National Gallery durante as suas vidas e ocorreu um bypass no comércio da arte: as leiloeiras viraram galeria imprestável. A galeria deixa de servir como intermediário/filtro e democratiza-se o mercado, porque num leilão o comprador pode não estar identificado, seja um fundo de investimento, um oligarca russo ou um oilgarca do Médio Oriente.

À escala portuguesa passou-se o mesmo. As leiloeiras passaram a dominar o mercado da arte e baixar os preços para vender o mais possível (com as vendas online a serem já muito superiores aos leilões presenciais). Como resultado, a arte dos artistas portugueses está a encolher e a ficar mais barata para se ajustar ao tamanho do negócio indígena — como a sardinha, que se quer pequenina. No registo de venda dos lotes de obras de artistas vivos, na plataforma digital de venda de obras de arte The Concerned Collector (de salientar que o valor de martelo é todo para o artista), observa-se que os tamanhos até 15 cm estão todos vendidos a um preço médio de 200€. As vendas caem 50% para tamanhos acima de 30 cm e 90% para tamanhos superiores a 50 cm. Isto indicia que o dinheiro também ficou pequenino, e que quem compra arte em Portugal só têm 200 € para gastar.

Esta liliputização da arte portuguesa para o tamanho e valor de 15 cm e 200€, pode, no entanto, não ser uma coisa má. Soluciona inúmeros problemas com que a arte e os artistas portugueses se debatem: passa a haver mercado, grandes coleções serão formadas, deixa de haver o óbice de onde guardar a coleção, os artistas passam a gastar muito pouco em materiais e não precisam de atelier. Basta uma cabana. As galerias desaparecem ou transitoriamente vendem através das leiloeiras, deixa de haver a comissão de 50% das galerias e passa para 0 ou 2% nas leiloeiras. Quando o artista morre a cotação não cai, porque já não pode, deixa de haver o problema de guardar o espólio do artista, porque vendeu tudo. Promove o colecionismo inter-geracional, uma vez que os filhos dos colecionadores que morrem não se vão dar ao trabalho de vender a coleção ou mesmo de a deitar para o lixo. Nos divórcios a mulher não vai querer ficar com a coleção de arte do marido porque não vale nada, e ainda, todos os artistas vão poder ter a sua casa museu num TØ da sua cidade.

Quando o Ministério da Cultura erguer o previsto novo Museu de Arte Contemporânea Portuguesa-Plus (MAC2P) em Almada, na forçosa proporção do Portugal dos Pequenitos, o orçamento de construção será enormemente exíguo e os custos de funcionamento residuais. O novo museu, para o qual será certamente realizado um mini-concurso internacional de arquitetura, apresentará e estudará a arte portuguesa produzida entre 2020 e 2060, onde todos os artistas nativos terão a sua exposição de revelação, a merecida exposição de meio de carreira e a devida retrospetiva — numa edificação descomunalmente pequena, em que os portugueses se sentirão gigantes a olhar para a arte dos seus artistas.

Resta saber se os artistas portugueses, nas próximas três gerações, se resignam a redimensionar o que fazem para o mercado que têm ou saem de Portugal antes dos 30 anos.

 

 

Pedro Portugal