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SENHA Z 672, DE LUÍSA CUNHAJOANA CONSIGLIERI2025-11-08
Palavras. Som. Palavras. Silêncio. Palavras mais palavras. Números sobre mais números. Silêncio. Frases que se misturam num espaço branco. A simplicidade da instalação sonora rompe o silêncio da desumanidade da sociedade atual. Entoa-se num discurso vibrante um apelo ao subtil da humanidade. Cruzam-se entre as fronteiras do coletivo e da identidade do ser, vozes que emanam das paredes e requerem toda a nossa atenção. Por vezes, interpelam-se umas nas outras, tornando-se quase como discursos alienados do mundo presente quotidiano para quem necessitasse de se focar para além da trivialidade ou de ultrapassar a impermeável esquizofrenia do mundo citadino contemporâneo. Neste discurso repetitivo, a artista Luísa Cunha, na sua última exposição Senha Z 672, que esteve recentemente na Galeria Miguel Nabinho, cruza e sobrepõe diálogos no white cube. Ecoam frases, palavras e números de senhas e gabinetes. Uma sensação de desassossego que permanece quase sempre em toda sua obra sonora. Sentimos o desvanecer da perda da identidade de cada indivíduo e simultaneamente invoca-nos a ela – ao ser – enquanto indivíduo, assim, escutamos: - Eu sou Luísa... Eu sou Berta… A voz ritmada com pausas e o som que entoa nomes de mulheres remete-nos para cada uma delas, cuja sensação melancólica dada pelo seu tom de voz, nos atira para o nada, como seres ausentes. Elas afirmam a sua existência, mas soa algo de estranho, para quem ouve uma leve tristeza na sua voz. Recorda-nos, de certo modo, John Cage, na sua Conferência sobre Nada (Oliveira, J. [1961] Silêncio, p. 109): Eu estou aqui e não há nada a dizer
Com Luísa Cunha, a suspensão do silêncio na sua obra exterioriza a simplicidade dos pequenos momentos do quotidiano, na frequência sonora do encadeamento das frases, uma reflexão ao que se ouve, na amplitude da palavra ou número, projeta-se o timbre de duração. Uma espécie de discurso sensorial que dilacera o ser na vibração do pensamento crítico. Através do escutar, Luísa Cunha possibilita ao público ponderar sobre aquilo que ouvimos, instiga pela sonoridade subtil a linha fronteiriça da sensação. Ela leva ao despertar de cada um de nós, e a pensar sobre a importância do escutar o outro e a nós mesmos, numa poesia sonora desconstrói a linguagem do ser, entre o ser e o nada soa a afirmação da existência e anulação de ela mesma. – Senha Z 672, gabinete 10. Senha Z 723, gabinete 12… Imagina-se a espera…. numa menção de frases comuns, cujas senhas se repetem, outras não… em ritmos constantes e de curta duração, pausadamente, surge a chamada de cada um, imaginando-se a entrada para cada gabinete. O ser passa a ser o nada. O sentir o silêncio, da memória do lugar à subtil sensação de saber escutar. O ser é o ser, grita-se à sua existência, numa expressão lacerante, de modo a acutilar o nada. Porventura, do centro emana a voz melancólica entre pausas, no som repetitivo, com pouca expressão. - Look at me……… Look at me……. Look at me……. As palavras soltam para o meio do espaço, cruzam com outras vozes. As mulheres que soa de um modo suspenso, uma de cada vez. Partilha-se um querer de permanecer no espaço, a exaltação da identidade. A voz da artista passa a dar lugar a outras mulheres. - Eu sou Olívia… Eu sou Maria… Eu sou Sara… Numa evidência ritmada, irrompe o espaço pela repercussão musical dos compassos, cuja interferência da vibração das várias vozes alude ao público outras conexões. - Look at me… Look at me… Look at me……. As vozes criam contrapontos entre elas, seguindo um compasso repetitivo, que se descentraliza o ritmo com a sensação da sobreposição dos outros dois padrões em simultâneo, entre as frases e o silêncio, profere-se o “eu”, um olhar para o ser e sentimos a frase. – Look at me… Look at me… Look at me……. A artista envolve-nos no som e na vibração espacial do desdobramento da sua voz. Intercala numa espécie de conversa absurda na qual não nos deixa tranquilos, de modo a incitar a procura do ouvinte a voz de quem permanece no espaço e não as conseguimos ignorar. - Look at me… Look at me… Look at me….... Descentramos o nosso “eu”, o público, pela mescla de vozes, que se contrapõem com o silêncio – o nada. Queremos ouvir ou concentrar em cada uma delas, ora nas mais melancólicas, ora nas mais inexpressivas, ora nas mais tristes, ouvimos e sentimos a vibração da voz e do silêncio. O ser e o nada. - Eu sou Alda…. O ser e a existência flutuam na vibração do nada. - Senha Z 746, gabinete 12, senha Z 820, gabinete 8 … Na sombra do silêncio, numa sonoridade atonal, na variação da ressonância, nasce a voz.
Joana Consiglieri
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Senha Z 672
Galeria Miguel Nabinho
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