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O ESTADO DA ARTE


Colored Vases (2007-10), Ai Weiwei.


Maximo Caminero esmagando vaso da instalação de Ai Weiwei, no Perez Art Museum, Miami. Still de video.


Detalhe do estrago causado pelo ataque de Mary Richardson à Vénus ao Espelho, de Velazquez, na National Gallery em 1914.


Mona Lisa, L.H.O.O.Q. (1919), Marcel Duchamp.


Insult to Injury (2003), Jake & Dino Chapman.


Tilted Arc (1981), Richard Serra.

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Antecedentes

A destruição recente de um vaso verde da dinastia Han pintado à mão, que fazia parte da instalação de Ai Weiwei, é um ataque rude tanto à expressão artística do autor como à própria arte.
A instalação de Ai Weiwei, Colored Vases (2007-10), incluída na sua retrospectiva itinerante que esteve patente no Pérez Art Museum em Miami, consistia em numerosos vasos Han pintados em diferentes cores brilhantes e que os assemelhavam a vasos modernos. Junto à instalação, uma série de fotografias a preto e branco mostravam Ai Weiwei a esmagar o que parecia ser uma urna da dinastia Ming.
Ironicamente, nesta ocasião, este crime artístico (que também foi capturado em vídeo) foi cometido por outro artista, Maximo Caminero, e não pelas autoridades chinesas – o adversário habitual de Ai Weiwei. O acto (alegadamente inspirado nas fotografias de Weiwei ao lado da instalação) foi erradamente pretendido por Caminero como um protesto contra a alegada falha do museu em exibir o trabalho de artistas locais. Caminero acabou por pedir desculpa pelas suas acções.
Aparte da potencial perda de um importante trabalho artístico, o valor monetário dos danos causados à instalação de Ai Weiwei foram reportados ampla e espectacularmente no valor de 1 milhão de dólares, embora não seja claro em que é que se basearam para chegar a este valor, que no mínimo parece exagerado (mesmo que fossem os custos de substituir a instalação como um todo).
A destruição de arte tem uma longa história, que é coextensiva com a própria história da arte. Ataques iconoclastas em nome da religião a imaginário religioso que representa a aparência de Deus ou Cristo é uma característica endémica do Cristianismo. Mais recentemente, ataques à arte têm sido motivados por ideologia política (por exemplo, os cortes na obra de Velazquez, Venus ao Espelho, 1647-51, feitos pelas sufragistas), assim como pelo desejo de notoriedade (como os repetidos ataques à Mona Lisa, c. 1503-5, de Leonardo da Vinci). A Tate Britain explorou o tema no ano passado numa exposição memorável, Art Under Attack: Iconoclasm in British Art.
Os artistas têm também apropriado a linguagem do iconoclasmo (como o reflectido aqui nas fotografias de Ai Weiwei) para dar força simbólica ao seu trabalho. Normalmente, no entanto, esta linguagem não é aplicada literalmente às imagens ou objectos profanos, mas antes à sua reprodução: como se vê, por exemplo, na maliciosa adição de um bigode e barba à face da Mona Lisa, L.H.O.O.Q. (1919). No entanto, em raras circunstâncias e de modo a aumentar a provocação, artistas têm recorrido à desfiguração do próprio original. Isto vê-se reflectido na controvérsia ‘rectificação’ que Jake & Dino Chapman fizeram nos raros esboços ‘originais’ (Insult to Injury, 2003) pertencentes à icónica série de Goya Os Desastres da Guerra (1810-20).


Protecção legal

O que é que pode ser feito para proteger as obras de arte e punir aqueles que voluntariamente as vandalizam? A lei providencia um número de ofensas para prevenir e punir ataques à arte, e com elas diferentes sanções legais. Por um lado, há ofensas criminais. Mais notoriamente, os vândalos podem ser punidos por danos criminais à propriedade: neste caso, é mais provável Caminero ser criminalmente acusado e preso pela sua acção. Por outro lado, há reparações civis. Uma pessoa que destrua uma obra de arte pode ser responsabilizada perante o seu proprietário por danos causados por interferência ilícita na propriedade (conhecida como conversão) e, caso tenha assumido a custódia sobre a propriedade, por violação dos seus deveres como depositário.
Alguns países providenciam, como parte da lei dos direitos morais, medidas cautelares para os artistas, de modo a prevenir a destruição das suas obras de arte e também os danos, se os seus trabalhos forem destruídos (incluindo pelos seus proprietários). Por exemplo, nos Estados Unidos da América, o Acto dos Direitos dos Artistas Visuais (1990), protege expressamente obras de arte de “estatuto reconhecido” (o que se aplica a obras de arte que são bem conhecidas, não apenas a obras de artistas que são muito conhecidos) de serem destruídas. Isto aplica-se também, em princípio, à remoção de trabalhos ‘site-specific’ dos seus locais. O Acto foi aprovado no seguimento do alvoroço nacional e internacional causado quando a obra de Richard Serra, Tilted Arc (1981), foi removida da Federal Plaza de Nova Iorque pelas autoridades americanas em 1989. Richard Serra não conseguiu nos tribunais de Nova Iorque impedir legalmente a remoção da obra por parte dos Serviços Gerais de Administração.
Apesar do direito moral de impedir a destruição de uma obra de um artista estar claramente inscrita na lei americana, não é claro até onde este direito está protegido noutros países que têm uma legislação de ‘direitos morais’. Não é claro, por exemplo, se o direito existe no Reino Unido, como parte do direito geral de um artista impedir o ‘tratamento depreciativo’ do seu trabalho.


Um direito da sociedade?

Apesar da variedade de sanções legais disponíveis para prevenir a destruição de obras de arte, existem ainda brechas. A principal falha parece dizer respeito aos proprietários das obras de arte. O proprietário (excepto onde o artista tem o direito de prevenir a destruição da obra), pode, de um modo geral, destruir a obra de arte, como no famoso caso do coleccionador japonês Ryoei Saito, que teria anunciado que gostaria de ser cremado com o seu Retrato do Dr. Gachet (1890) de Van Gogh, no valor de 82,5 milhões de dólares – parte-se do princípio de que os proprietários de obras de arte não desejam destruir a sua propriedade pessoal, principalmente se esta é de valor financeiro.
A destruição do vaso de Ai Weiwei levanta importantes questões legais e culturais sobre porque é que se valoriza a preservação de obras de arte. Não deveria a sociedade ter um direito primordial de proteger os seus artefactos culturais, juntamente com os direitos dos proprietários e artistas? Assim como há leis do património concebidas para proteger monumentos e edifícios de interferências e destruição, não deveriam estas ser aplicadas aos objectos de arte? Obviamente que o modo como estas seriam enquadradas é outra história e poderá envolver os tribunais no negócio problemático de julgar: ‘O que é arte?’ [versão portuguesa do original inglês]



Daniel McClean
É advogado especializado em arte, bens culturais e em direito da propriedade intelectual, trabalhando com diferentes sectores do mercado de arte, incluindo artistas, colecionadores, galerias e museus.



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Este artigo foi originalmente publicado na ArtReview, Maio 2014.